Em Portugal a fruta é deliciosa, sabe a sol,
dizia-me uma amiga belga numa das suas várias visitas ao nosso país. Nunca
tinha pensado no sabor da fruta nesses termos, mas adorei e pensando bem ela
tem toda a razão. Temos tendência a não valorizar o que havemos como garantido
e em Portugal o sol é garantido, já na Bélgica…
Graças ao grau de maturação proporcionado pelas
muitas horas de sol, a fruta em Portugal tem um gosto muito especial e
autêntico. Quem não tem o privilégio de a poder saborear diariamente sente bem o
seu gosto especial e aprecia a nossa fruta quando tem o prazer de o fazer.
Apesar de termos fruta durante todo o ano é na
primavera e verão que há mais variedade e em que ela sabe melhor, que sabe
realmente a sol. E fruta a saber a sol é: no fim da primavera trincar um pêssego
perfumado e suculento e o seu sumo escorrer pela boca e pelas mãos e ficarmos
peganhentos de lamber as mãos antes de as lavarmos; é colocar de uma só vez na
boca 5 ou 6 cerejas carnudas e negras e ir cuspindo os caroços e repetir o
gesto uma e outra vez até acabar todas as cerejas do cesto e ficarmos com a
língua preta; é nas férias de verão levar uma caixa com cubinhos de melão fresco
para a praia e sentir a sua doçura salpicada por gotinhas salgadas de mar; é
comer melancia num terraço ao pôr-do-sol; é devorar uma mão cheia de ameixas
sumarentas e ter esperança que não faça mal; é sentir o aroma a maçãs verdes no
pomar, apanhar uma, trincar e sentir o suco agridoce libertar-se da polpa
crocante; é no fim do verão debicar uvas redondinhas, de vários tamanhos, de um
cacho grande e negro, uvas de polpa suave e doce; é deixar-se envolver pelo
morno, adocicado e seco perfume das figueiras e ficar de lábios colados
enquanto o fruto se desfaz na boca e se absorve todo o seu açúcar; é também
brindar com amigos ao fim do verão e comer as amoras e framboesas embebidas na
sangria.
A minha amiga belga não chegou a verbalizar, mas
vi na sua expressão de prazer deleitando-se com a salada que acompanhava o
churrasco, que não é só a fruta que sabe a sol em Portugal. Também o
manjericão, os coentros, orégãos, a hortelã, a alface e o tomate (na realidade
o tomate é fruta), sabem a sol. Se juntarmos todos estes elementos numa salada,
a que adicionamos cebola finamente cortada, temperada com sal marinho, azeite
virgem e vinagre balsâmico e se a enriquecermos com bocadinhos de queijo fresco
de cabra alimentada nos campos, conseguimos sentir o sabor dos raios de sol que
pela manhã acariciam as plantas e as despertam da noite fresca, dos raios de
sol escaldante do meio-dia que as enchem de vida e de energia e dos raios de
sol que na serenidade preguiçosa do entardecer lhes prolongam a cor e o
paladar.
E o vinho? Achará a minha amiga que o vinho em
Portugal sabe a sol? Desconfio que sim, mas não me chegou a dizer…adormeceu.
Margarida Veríssimo
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