Terminei de ler o livro, pousei-o na mesa e liguei
o computador para fazer uma pesquisa ao site
do autor e obter mais informações sobre ele e os títulos editados. Deparei-me
logo com a informação que o livro que acabara de ler tem uma edição especial
comemorativa do seu 25.º aniversário…25 anos, como é possível? O livro é tão
atual! Bem, a história decorre há mais de 2000 anos, mas as imagens que fui
criando à medida da leitura foram tão atuais, a definição da imagem e do som era
de uma qualidade e nitidez impressionantes, os efeitos especiais e as cenas de
ação tão realistas que era como se estivesse lá a presenciar e a viver os
acontecimentos, até a banda sonora e o guarda-roupa denotavam as tendências contemporâneas,
adaptadas à época a retratar, bem entendido.
A verdade é que se virmos um filme com 50 anos,
por muito intemporal que a história seja, sentimos bem a sua idade, apercebemo-nos
que a qualidade e definição da imagem já estão ultrapassadas, para não falar
dos efeitos especiais e cenas de ação que no mínimo fazem-nos sorrir. Em contrapartida,
podemos ler um livro escrito há 100 anos ou um livro acabado de publicar, mas
fazemos sempre a conversão das letras para imagens atuais, nítidas e a cores. A
reação a um livro lido pela primeira vez será sempre idêntica à de um filme
acabado de estrear, com a grande vantagem que lendo o livro somos nós os
realizadores das imagens criadas na nossa imaginação. Ler é dos melhores e mais
acessíveis exercícios de estímulo à imaginação e à criatividade, a par de
desenhar, esculpir e, claro está, escrever.
Por cada livro que leio é como se produzisse um
filme que apenas eu consigo visualizar. Dependendo do livro, por vezes as
imagens criadas, os locais e personagens, acompanham-me muito depois de ter
finalizado a leitura e às vezes até tenho a ousadia de criar novos cenários e
situações não descritas no livro, prolongando a vida das personagens. Por essa
razão, pelo apego e relação que crio com os livros e suas personagens, quando
termino a leitura de um livro não inicio logo a leitura de um novo. Dou sempre
um tempo a que chamo de “luto” que será mais ou menos longo dependendo dos
laços criados.
Quantos mais livros lemos mais abastada está a
nossa memória com imagens por nós criadas. É uma infinidade de locais reais e
imaginários, naturais e construídos, de situações, de objetos, de ações, de personagens,
de trajes e até, bem lá no fundo da nossa consciência, de cheiros e bandas
sonoras.
Tenho um primo que tem o sótão a transbordar de
livros. Estão no sótão os livros que já não foram a tempo de ganhar um honroso lugar
numa estante em qualquer uma das restantes divisões da casa. Entrar naquele
sótão é como passar um portal mágico que nos leva para um mundo surpreendente
de possibilidades ilimitadas de exercício à criatividade. Imagino o cérebro
desse meu primo tão repleto de infindas e diversas imagens. Tão repleto que por
vezes explode em devaneios súbitos. Felizmente que esse meu primo tem o dom de
conseguir materializar os seus devaneios em forma de sentidos poemas. O meu
primo é poeta!
Margarida Veríssimo
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