Coloco vários cubos de gelo no copo largo de pé.
Faço um movimento circular permitindo que toda a superfície de vidro arrefeça
em contacto com o gelo. No fogão, o tacho de barro já tem cebola e alho a
estrugir numa generosa dose de azeite. São adicionados alguns raminhos de
coentros e uma folha de louro, sentindo-se de imediato o seu aroma. Corto uma
lâmina de casca de lima e dobro-a para que os pequenos poros da pele rebentem e
libertem toda a essência que será transferida para a superfície interior do
copo. Sirvo uma dose de gin e uma de água tónica, de boa qualidade. Acrescento
algumas bagas de zimbro e fios de casca de lima - o aroma que emana do copo é
fresco e com um toque de acidez. Distraí-me na preparação do gin e mais uma vez
não vi qual o ingrediente misterioso usado na confeção do divinal arroz de
marisco que ele teima em não me revelar. Tanto melhor, será sempre ele o chefe
responsável pela sua confeção. A mim irá saber-me maravilhosamente. A sua
fragrância deliciosa já alastrou a toda a casa, está em bom andamento. O vinho
verde repousa no frio, será servido bem gelado com o prato principal.
Enquanto finaliza o arroz de marisco bebe o gin
tónico que preparei. Entre ingredientes e mexedelas aproveito para bebericar
também, ficou delicioso. Foram, entretanto, preparados outros aperitivos para
acompanhar os petiscos que já estão sobre a mesa: queijo creme envolvido em mel,
morcela e farinheira grelhadas e ainda queijo do Rabaçal. No centro da mesa há
um cesto com tostas, broa de milho e pão fatiado. Para finalizar a refeição há
melão casca de carvalho, mas tenho dúvidas que no fim alguém tenha estomago
para ele.
A refeição decorreu animada e prolongou-se noite
dentro. Várias garrafas de vinho foram abertas e consumidas. No final não
sobrou nada do melão que se revelou uma solução acertada, para além de
extremamente saborosa. A noite foi quente, de ânimos e de temperatura e o melão
fresco ajudou a refrear e a refrescar, mantendo a boa disposição entre amigos.
Estas jantaradas de fim-de-semana têm a capacidade
de renovar energias, de alimentar amizades, de fazer esquecer os
descontentamentos do dia-a-dia, de celebrar a vida e de partilhar sabores. O
convívio entre amigos quando é feito à volta de uma mesa, partilhando
refeições, fortalece as raízes que sustentam essa mesma amizade. O mesmo
alimento que sacia o corpo alimenta a amizade, revigorando-a.
Somos mestres na arte de alimentar laços e
desconfio que não é apenas pelo simples prazer do paladar que a nossa
gastronomia é tão rica, variada e saborosa, mas pela importância que lhe
reconhecemos nas relações humanas.
Podemos partilhar refeições frequentemente com o
mesmo grupo de amigos, mas os repastos serão sempre diferentes, haverá sempre
um prato novo a experimentar, a apurar, uma inovação que se quer apresentar… e
as refeições serão sempre prolongadas, acompanhadas com um bom vinho para
soltar as emoções retraídas do quotidiano. A variedade e diversidade das
refeições em família é uma meta que tentamos atingir. Apesar da falta de tempo
caraterística da nossa vida ocupada, faz-se um esforço para que o momento seja
agradável e harmonioso, ao paladar e ao convívio, com experiências
gastronómicas, introdução de novos alimentos aos membros mais novos da família
e a oportunidade de proporcionar conversas despreocupadas. Na altura mais feliz
da minha vida profissional, com um ambiente irrepetível entre colegas e chefe,
pela amizade, respeito, colaboração, apoio e dinâmica de trabalho, a equipa,
estimulada pelo líder, fazia reuniões de trabalho em almoços que se prolongavam
pela tarde. Nunca foi tempo de trabalho desperdiçado, bem pelo contrário, as
reuniões à volta da mesa de refeição foram sempre muito produtivas e isso
refletia-se na execução das nossas tarefas. Houvesse mais chefes e patrões a
perceber estas dinâmicas e decerto a produtividade do país aumentava!
Margarida Veríssimo
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