segunda-feira, 5 de março de 2018

CRÓNICA | A dor não é só nossa | VANESSA LOURENÇO


Li esta semana uma noticia online que me preocupou, e confesso que nunca tinha pensado muito no assunto: o facto de existirem crianças que pensam que os animais não sentem dor. Quer este facto se fique a dever à forma como diferentes famílias encaram os animais, tendências culturais ou individuais, o que é facto é que os animais sentem dor e devem ser respeitados, e esse é um dos valores que devemos passar às nossas crianças. 
A história? Essa, é mais ou menos assim:

Pela mão da avó, vinha a saltitar pelo caminho de terra e a rir às gargalhadas. Estava uma manhã soalheira depois de uma noite chuvosa, e a toda a volta se podia ouvir o vento a rodopiar por entre os ramos das árvores e ver os pássaros a dançar no céu. Subitamente, sentiu um puxão no braço e deu um passo atrás. Procurou os olhos da avó e encontrou neles alívio:

- O que foi?

A avó libertou-lhe a mão e agachou-se à sua frente, para apanhar qualquer coisa do chão. Quando se voltou para ele, sorrindo, estendeu-lhe a palma da mão nodosa à altura dos olhos e mostrou-lhe um pequeno passarinho ainda jovem:

- Quase o pisaste.
Franziu o sobrolho e aproximou o nariz da pequena criatura encolhida que piava incessantemente, sem compreender:

- Mas é tão pequenino... faz mal pisá-los quando mal os conseguimos ver?

 A avó suspirou, abanou a cabeça e sorriu, com aquele sorriso das pessoas que nunca envelhecem. Respondeu:

- Consegues vê-lo agora, aqui na minha mão?

O neto voltou a aproximar o nariz da pequena criatura que agora se arrastava lentamente pela mão da avó, não muito certo de estar em segurança, e levantou de novo os olhos para ela:

- Sim, está mesmo aqui!

A avó sorriu:

- Porque são pequeninos, nem sempre os conseguimos ver. Mas podemos estar atentos enquanto caminhamos, e evitar magoá-los.

A avó olhou em volta, encontrou o ninho e colocou o passarinho de volta. Enquanto a via fazê-lo, o neto perguntou:

- Mas avó... os animais também sentem dor?

A avó ficou subitamente mais séria, embora o brilho nos olhos fosse o mesmo. Ouviu-a dizer:
- Sim, sentem dor tal como nós. Porque perguntas isso?

O neto encolheu os ombros e olhou em volta, pontapeando uma pequena pedra para longe:
- Não sei bem... eles não falam, por isso achei que também não se magoavam...

A avó franziu os lábios e baixou-se para o olhar nos olhos, as mãos pousadas nos seus ombros:

- Não falam? Presta atenção: o que é que ouves?

Ele fechou os olhos por uns segundos e respondeu:

- Ouço os pássaros a cantar, e o cão do vizinho Tó a ladrar ao longe.

A avó sorriu e endireitou-se, sem retirar as mãos dos seus ombros:

- Vês? Lá porque não falam como nós, não quer dizer que não falem. Ou que não sintam dor.

Ele franziu o sobrolho e coçou a cabeça com a mão pequenina, e logo depois abraçou a avó com força:

- Eu não gosto que me magoem... e não quero magoar os animais. Eles são nossos amigos e esta também é a casa deles. Prometo que vou ter cuidado, avó!

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