sexta-feira, 16 de março de 2018

CRÓNICA | Férias | MBARRETO CONDADO

“Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança com nomes, pessoas, factos ou situações da vida real terá sido mera coincidência”

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As férias do Asno eram sempre passadas no Algarve na casa da irmã, sim porque o pai apesar de “arrotar postas de pescada” de que tinha casas por todo o Portugal, na realidade referia-se mesmo a jazigos senhoriais no cemitério do Alto de São João (com vista para o Tejo, o que aumentava o valor da propriedade) roubados às velhas e decrépitas senhoras que furtara durante os seus altos anos (entenda-se por altos em número de furtos de jazigos e não em estatura porque afinal a criatura tinha pouco mais de metro e meio).

As férias do asno eram, sempre um pouco agridoces ou não tivesse ele que tomar conta dos seus dois sobrinhos.

O mais velho influenciado pelo avô materno (também conhecido na alta roda funerária como “O Senhor dos Jazigos”) adquirira as mesmas manias de grandeza, passava os dias sentado numa velha cadeira de praia, como se de um trono de tratasse, com uma velha manta de cor borgonha, ou como diria o asno uma cape bordeaux, com um toco de um velho varão de casa de banho como ceptro, não necessitava de coroa porque o seu áspero cabelo exercia essa função.

Já o mais novo que herdara a beleza símia e sorriso equino de sua mãe (mesmo com esforço os dentes não lhe cabiam todos dentro da enorme boca), passava os dias a saltar de sofá em sofá enquanto deglutia as bananas que a empregada entretanto contratada para ajudar na árdua tarefa da limpeza do bem estruturado T0, lhe trazia todas as manhãs.

Era nesses parcos momentos que o asno se esgueirava para a praia de Faro para descomprimir da sua imberbe existência. Nunca saia de casa sem desenhar com os dedos molhados (possivelmente de óleo de fritar) um caracol na testa que não se mexia um único milímetro nem mesmo depois de apanhar um enxerto de porradas das ondas e de andar enrolado na rebentação já sem calções e com o carnudo rabo ao léu.

Era, contudo, um prazer observá-lo a chegar à praia de Faro. Tinha sempre o cuidado de escolher a praia de frente para a ponte, a única com nadador salvador.

Aparecia no topo do areal sentindo-se o Tarzan Taborda, a minúscula toalha de bidé que retirara da casa de banho da irmã displicentemente atirada por cima do ombro esquerdo (a mesma que tinha para se limpar quando chegasse a casa e durante todo o Verão que permanecesse em casa da irmã, nas palavras da mesma era no poupar que estava o ganho), ajeitava discretamente a sua masculinidade já por si apertada nos calções que tinham sido da juventude do seu pai e que ainda estavam muito em voga apesar de já se terem passado uns meros setenta e seis anos.

Olhava atentamente em volta não à procura de um local desocupado, mas de um que tivesse lotado de estrangeiras (de preferência mais velhas, como o pai lhe ensinara) afinal aquele corpinho tinha que se alimentar bem durante o dia porque o jantar em casa da mana nunca era garantido.

Se ao menos o sobrinho lhe deixasse uma bananinha…



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