“Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança com nomes,
pessoas, factos ou situações da vida real terá sido mera coincidência”
*
As férias do Asno eram sempre passadas no Algarve
na casa da irmã, sim porque o pai apesar de “arrotar postas de pescada” de que
tinha casas por todo o Portugal, na realidade referia-se mesmo a jazigos
senhoriais no cemitério do Alto de São João (com vista para o Tejo, o que
aumentava o valor da propriedade) roubados às velhas e decrépitas senhoras que furtara
durante os seus altos anos (entenda-se por altos em número de furtos de jazigos
e não em estatura porque afinal a criatura tinha pouco mais de metro e meio).
As férias do asno eram, sempre um pouco agridoces
ou não tivesse ele que tomar conta dos seus dois sobrinhos.
O mais velho influenciado pelo avô materno (também
conhecido na alta roda funerária como “O Senhor dos Jazigos”) adquirira as mesmas
manias de grandeza, passava os dias sentado numa velha cadeira de praia, como
se de um trono de tratasse, com uma velha manta de cor borgonha, ou como diria
o asno uma cape bordeaux, com um toco
de um velho varão de casa de banho como ceptro, não necessitava de coroa porque
o seu áspero cabelo exercia essa função.
Já o mais novo que herdara a beleza símia e sorriso
equino de sua mãe (mesmo com esforço os dentes não lhe cabiam todos dentro da enorme
boca), passava os dias a saltar de sofá em sofá enquanto deglutia as bananas
que a empregada entretanto contratada para ajudar na árdua tarefa da limpeza do
bem estruturado T0, lhe trazia todas as manhãs.
Era nesses parcos momentos que o asno se
esgueirava para a praia de Faro para descomprimir da sua imberbe existência. Nunca
saia de casa sem desenhar com os dedos molhados (possivelmente de óleo de
fritar) um caracol na testa que não se mexia um único milímetro nem mesmo
depois de apanhar um enxerto de porradas das ondas e de andar enrolado na
rebentação já sem calções e com o carnudo rabo ao léu.
Era, contudo, um prazer observá-lo a chegar à
praia de Faro. Tinha sempre o cuidado de escolher a praia de frente para a
ponte, a única com nadador salvador.
Aparecia no topo do areal sentindo-se o Tarzan
Taborda, a minúscula toalha de bidé que retirara da casa de banho da irmã
displicentemente atirada por cima do ombro esquerdo (a mesma que tinha para se
limpar quando chegasse a casa e durante todo o Verão que permanecesse em casa
da irmã, nas palavras da mesma era no poupar que estava o ganho), ajeitava discretamente
a sua masculinidade já por si apertada nos calções que tinham sido da juventude
do seu pai e que ainda estavam muito em voga apesar de já se terem passado uns
meros setenta e seis anos.
Olhava atentamente em volta não à procura de um
local desocupado, mas de um que tivesse lotado de estrangeiras (de preferência
mais velhas, como o pai lhe ensinara) afinal aquele corpinho tinha que se
alimentar bem durante o dia porque o jantar em casa da mana nunca era
garantido.
Se ao menos o sobrinho lhe deixasse uma bananinha…
Sem comentários:
Enviar um comentário