Viver em
Portugal é conviver com a sua gente de sorriso simpático, pronta a ajudar e a
aproximar-se sem reservas dos seus interlocutores, sejam eles de que
nacionalidade forem – a hospitalidade portuguesa e a facilidade de falar
qualquer língua são sobejamente conhecidas - e usufruir de um clima de sonho,
sem catástrofes naturais de maior monta, em paisagens desde a neve ao mais fino
areal da praia; é desfrutar de uma luz natural, com um brilho raro, muito
superior a outros locais do mundo; é degustar uma das melhores cozinhas e
néctares e ter a felicidade de caminhar calmamente nas ruas em liberdade e
sossego.
Mas ser
português tem outro lado, incompreensível para quem preza a justiça e a
verdade. Portugal tem um dos salários mínimos mais baixos da Europa, uma carga
horária laboral elevada, uma taxa de desemprego insustentável, um serviço de
segurança social podre, importa muito mais do que exporta e assiste, impávido,
a todo o tipo de corrupção ao mais alto nível. Temos políticos que “desviam” e
promovem tudo o que lhes convier, banqueiros coniventes com operações ilícitas
na alta finança, juízes que, conscientemente, se demitem das suas reais funções
e assumem posturas parciais e tremendamente questionáveis, médicos que rasgam o
juramento de Hipócrates e se associam à máquina moedeira das farmacêuticas, entidades
que roubam crianças aos seus progenitores e outras que deveriam cuidar delas e
dos nossos velhos e os mantêm em vivências completamente inaceitáveis aos
padrões humanos, polícias que são condenados por fazerem o seu trabalho,
grandes empresários que mais parece quererem destacar o que é feito lá fora do
que cá dentro e… nada é feito para travar isto.
Tudo se
vai desenrolando, impunemente, mês após mês, ano após ano, década após década,
à frente dos nossos olhos, num país que é um dos mais ricos do mundo em
recursos naturais. Temos tudo o que é necessário para viver – não é sobreviver
– sem praticamente depender de mais ninguém. Temos gás natural, petróleo,
minerais diversos, sol em abundância, grandes extensões de solo arável e
cultivável, óptimos aquíferos, um oceano rico em peixe, um clima excelente para
qualquer tipo de agricultura e grandes mentes. Isto em linhas muito gerais.
Porque
razão preferimos usar-nos do que é dos outros em vez do que é nosso? Porque não
aproveitamos os recursos e as boas capacidades que temos – porque as temos,
sim! - para criar emprego sustentável, para fazer crescer o país, para repor a
justiça social, ao invés de apostarmos naquilo que os outros produzem? A
relação entre os recursos naturais e o poder mundial é bem conhecida e nós
temo-los de sobra. Porque continuamos a encolher os ombros à miséria de sistema
em que vivemos? A resposta, creio, está nos nossos “brandos costumes”, como é
hábito ouvir-se dizer. Aceitamos tudo o que nos é feito, mesmo que nos faça
muito mal. Somos um povo permissivo, de conversa de café. Ali despojamos a
corrupção e a injustiça de tudo e mais alguma coisa, somos super-heróis que se
batem estoicamente pelo justo e pela igualdade de peito feito, mas depois, de
volta à realidade diária, baixamos a cabeça e os braços e pensamos que melhores
dias virão. Têm que vir, pois claro.
A pensar
morreu um burro – ditado popular.
Sem comentários:
Enviar um comentário