No passado dia 25 de Abril grande parte do país, de Norte a Sul, saiu à rua em romaria de cantares de Abril apregoando as conquistas da revolução, relembrando heróis e, num já gasto e pouco convincente cliché, celebrando a liberdade!
Curiosamente...ou não, eu que nasci no ano da Revolução, tenho este ano assumidamente clamado por uma verdadeira Revolução na área da justiça em geral, e da advocacia em particular e devo confessar que não senti vontade de ir para a rua celebrar um conceito que, a meu ver, é hoje mais aparente e mítico do que real!
Senão Vejamos, somos um país livre? Sim! Muito bem, então se assim é, porque me dizem que eu e tantos outros colegas Advogados não podemos continuar a exercer a nossa profissão, a não ser que tenhamos um determinado e tendencialmente elevado estatuto sócio-económico?!
Somos democratas? Sim ! Muito bem! Então porque assistimos quase todas as semanas à descoberta de obscuras redes de interesses, lobbies, trocas de favores, corrupção ao mais alto nível e porque vemos políticos que - à esquerda, ao centro e à direita - adulteram ou "embelezam" intencionalmente currículos académicos para, talvez, alimentar falsamente a sua auto-estima e, acima de tudo, em busca de uma mais sólida posição na política nacional!
Somos livres? Sim! Muito bem! Então porque somos nós contribuintes a pagar as pesadas facturas da falência de grandes bancos privados, e porque assistimos à descapitalização do único grande banco público (Caixa Geral de Depósitos) em prol de socorrer essas mesmas perdas do foro privado?!
Somos um Estado de Direito Democrático? Sim! Muito bem! Mas esse mesmo estado que não reconhece direitos iguais a todos os seus cidadãos, e que tem uma classe despojada dos mais basilares direitos sociais e assistenciais: os advogados não têm direito a baixa por doença, não têm direito a condigno apoio à maternidade e paternidade, nem têm direito a optar pelo regime contributivo que seja mais justo, equitativo e consentâneo com os seus rendimentos efectivamente auferidos! (Estou a repetir-me, sim estou, mas não me cansarei de o fazer até que alguém nos oiça!).
Somos livres? Sim! Muito Bem! Então porque somos considerados proscritos, temerários ou loucos se ousamos remar contra a corrente, exercitar o nosso espírito crítico e olhar para certas realidades com o nosso próprio e peculiar olhar e não pela lente de terceiros (ainda que estes possam ser uma maioria...envergonhada ou conformada!) Seja-nos permitido pensar livremente pela nossa própria cabeça, livres das amarras do politicamente correcto, do conformismo, do "by the book"!
Abril trouxe consigo a democracia? E de que espécie de democracia falamos quando temos uma classe política que não vence nem convence, como demonstram as elevadas taxas de abstenção!
Somos livres? Sim! E quanto nos custará essa liberdade na forma como deixamos que seja exercitada sem controlo pelas gerações futuras? Que esperar de jovens cuja principal ambição de vida é "ser como o Cristiano Ronaldo" (como se ser excepcional fosse regra), ou possuir o mais recente modelo de tablet, telemóvel ou consola de jogos electrónicos? Que esperar de jovens que, na sua maioria, não têm hábitos de leitura, e que se recusam a escrever um texto, alegando em sua fraca defesa "falta de imaginação"?!
O que nos é permitido esperar? Que país? Que políticos? Que sociedade? Que valores? Que Justiça? Que confiança nas instituições? Que liberdade? Que "Abril"? Que Futuro?
"Abril"é uma página da história, nem sequer é linear, nem sequer é totalmente inocente (embora por vezes seja idealizado), não foi o último capítulo, e nem mesmo creio que seja o último, e temo que o livro da história nacional possa não ter o desejado "Final Feliz"!
Resta-nos, ao menos, a liberdade do inconformismo, por isso, citando Manuel Maria Barbosa du Bocage ouso perguntar:
"Liberdade, onde estás? Quem te demora?
Quem faz que o teu influxo em nós não caia?"
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