Há umas semanas comemorou-se o Dia
Internacional da Família e, logo que tomei conhecimento desse facto, dei por
mim a reflectir no conceito familiar da actualidade – ou não fosse eu dona de
uma “mente inquieta”. Os neurónios, frenéticos, alternavam entre o modelo do
passado e o do presente e nas suas implicações nas famílias e na sociedade.
Antigamente
vivia-se para a família, para a ordem, a harmonia e a paz no lar. Tudo o que se
fazia era pensado em termos familiares. Todos os seus elementos tinham papéis
bem definidos e a vida decorria de forma tranquila. Os homens saiam de casa e iam
prover o sustento, o conforto e travavam todas as lutas necessárias para a
protecção e bem-estar daqueles que amavam. As mulheres, na sua maioria, ficavam
em casa a construir e a manter a união, a acompanhar e a educar os filhos, a
prepará-los para serem gente decente – alguns iriam, mesmo, decidir os destinos
de todos nós -, e a acarinhar e a amparar aqueles que, já gastos e sem forças,
lhes tinham dado a possibilidade de pisar este mundo. Não havia cá lugar a
abandonar os velhos pais num qualquer lugar inumano ou a deixar os filhos entregues
à sua sorte, à mão de semear de todas as tentações e perigos.
O resultado era um respeito generalizado,
velhos a acabarem os seus dias com conforto e dignidade e crianças a crescerem
fortes, felizes, bem preparadas para o futuro e que respeitavam e idolatravam
os pais, os seus modelos.
Durante
muito tempo viveu-se neste equilíbrio de valores, como uma máquina com várias
engrenagens que se encaixam e completam para um único objectivo: funcionar bem,
com o mínimo de percalços e esforço. E depois tudo mudou. As mulheres começaram
a sair de casa para ocuparem os lugares até então dos homens, mas estes não
ocuparam os das mulheres. Elas viram-se sobrecarregadas, forçadas a desempenhar
dois papéis distintos em simultâneo, consecutivamente, e as fundações
familiares deixaram de ter sustentação e abanaram por todos os lados.
De
repente já não havia tempo para um carinho aos velhos, que passaram a morrer no
abandono e tristeza, nem para uma formação adequada dos novos, que se afastavam
cada vez mais dos progenitores e se tornavam verdadeiros estranhos que apenas
partilhavam o mesmo espaço; passaram a crescer “à rédea solta”, com os exemplos
e “ensinamentos” dos amigos, vazios de respeito, empatia, honra e espírito de
sacrifício, acreditando veementemente que tinham um estatuto igual ao dos seus
pais sem nada fazerem para isso.
De
repente as pessoas já não tinham paciência umas para as outras, nem respeito,
nem vontade e, à mínima contrariedade, divorciavam-se e “mandavam às urtigas” o
equilíbrio em prol do recém-descoberto “eu”. Os nossos descendentes passaram a
considerar normal que cada um vivesse para seu lado, com as suas necessidades sempre
em primeiro lugar, que o individualismo era a base de tudo, fomentando o
egocentrismo e egoísmo.
De repente vivíamos numa sociedade
que o era só de nome, onde éramos cada vez mais em número mas estávamos cada
vez mais distantes, sós e infelizes, mais intolerantes e beligerantes, onde o
negrume do caos aumentava dia a dia. Tudo isso estava bem patente nas
incompreensíveis guerras, na corrupção instalada em todas as áreas, nos
assassinatos pela mais pequena disputa e nas diversas injustiças sociais. Cada
vez mais abríamos o mundo a gente sem conteúdo valoroso.
Cheguei à conclusão que é urgente
repensarmos os nossos valores, as nossas escolhas. A família é a base de tudo,
é o nosso norte. Não pode ser descurada. Se o fizermos corremos o risco de
perdermos a nossa identidade e nos tornarmos verdadeiras bestas. Sim, o mundo
muda e temos que nos adaptar, mas há coisas que não devem, nunca, perder a
importância que na realidade têm. Esta é uma delas.
Ainda me lembro das estórias que a
minha mãe me contava tranquilamente, com todo o tempo do mundo, antes de
adormecer. Recordo, com carinho, de irmos passeando e conversando até à
mercearia para fazer compras a meio do dia. E dos lanches que me dava quando
chegava da escola, enquanto me perguntava o que tinha aprendido. Quantos dos
nossos filhos poderão, daqui a cinquenta anos, como eu, dizer o mesmo?
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