Faltam quatro dias para ter início, na Cidade de Viseu, o VIII Congresso dos Advogados Portugueses, que ali terá lugar entre os dias 14, 15 e 16 de Junho de 2018, ironicamente sob o tema "Uma advocacia mais forte numa sociedade mais justa".
Digo ironicamente, porque nunca antes se assistira a um ambiente tão instável, hostil, antidemocrático, entre os pares da Classe Profissional que tem por missão a defesa dos mais fracos contra a injustiça, os abusos de poder, e falta de segurança jurídica!
Nunca antes foi tão visível e perceptível entre os muitos membros desta Classe onde, por enquanto, ainda me incluo, uma tensão permanente, alguma agressividade que chega a levar ao esquecimento dos mais basilares e essenciais deveres de urbanidade que devem, por força de norma estatutária, além da mais elementar boa educação, pautar as relações entre Advogados.
É com profunda tristeza que reconheço estar, quiçá, a assistir ao "fim dos tempos", em termos de exercício profissional para muitos Colegas que exercem em regime individual por todo o país, sujeitos às naturais contingências menos positivas e instáveis das economias locais onde laboram.
É com profunda indignação que receio ver cair por terra a esperança de, junto daquele que é o Órgão máximo da Ordem dos Advogados, um debate livre, esclarecido, sem tabus, sem cercear o exercício democrático intra-institucional, de diversas questões que estão na ordem do dia para a grande maioria dos Advogados Portugueses, nomeadamente, a questão da previdência social (o elevadíssimo esforço financeiro sem retorno que constitui a vinculação à Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores; ponderando-se mesmo a possibilidade de opção por regime mais favorável, ou a consideração dos rendimentos efectivamente auferidos e não decorrentes de presunção legal).
Também não é menos certo que, por contingências logísticas que se prendem com o espaço onde decorrerá o evento, eu e outros Colegas, todos subscritores de pelo menos uma ou várias comunicações, não teremos assento nos trabalhos do Congresso, sequer com o legítimo estatuto de Observadores... obviamente, não se tratará da existência de quaisquer estatutos de Persona non Grata, quero crer! Todavia, a circunstância de não haver sido feita a contabilização dos potenciais assistentes ao Congresso (mormente através da análise da quantidade de subscritores de Comunicações que não revestissem a qualidade de Delegados eleitos ao Congresso) gerando obstáculos logísticos que afastam o olhar de pares para o que de relevante ali se deverá e irá discutir faz pensar num défice democrático, ainda que o mesmo possa decorrer de meras falhas de organização a corrigir futuramente!
Não menos preocupante é fazer um percurso por todas as comunicações do Congresso, que se encontram publicadas em formato PDF na página do mesmo (documentação que poderá ser consultada AQUI) e encontrar, novamente num rasgo da mais cruel ironia, comunicações que são, em si mesmas, um ataque grave ao próprio sistema onde se inserem.
Estejamos atentos, alerta e prontos a lutar, não podemos aceitar que, após termos sido submetidos aos formalismos de admissão à Ordem dos Advogados, tendo passado por um processo de Estágio durante o qual prestámos provas em termos teóricos e práticos, durante o qual passámos por um momento final de avaliação - Prova de Agregação - onde apenas acederá à profissão quem for considerado apto para tal, após escrutínio dos pares!
Por tais razões, não podemos aceitar passivamente ver ser colocado em crise o sistema de tirocínio para acesso à profissão, partindo-se de generalizações perigosas e, porque não dizê-lo, ofensivas quando se expressam opiniões que abalam a formação académica prestada pelas Universidades e, pasme-se, a formação profissional assegurada pela própria Associação Profissional que representa a Classe!
Gravíssimo e ao arrepio das normas da nossa Lei Fundamental será ver debater num Congresso daquela que, em tempos, foi considerada a Casa da Democracia ideias que passam por uma assumida e crescente elitização da profissão, assumindo-se publicamente o entendimento de que é necessário auferir determinados rendimentos para que seja possível exercer Advocacia em Portugal; assumindo-se publicamente o entendimento de que deve haver formação contínua (em sentido formal) como condição para integrar o Sistema de Acesso ao Direito e aos Tribunais, assumindo-se publicamente o entendimento segundo o qual a qualidade/Categoria Profissional passa a ser algo precário, instável cujos requisitos de acesso devem ser aferidos caso a caso de dez em dez anos (algo como licenças temporárias para o exercício da profissão, sujeitas a caducidade e cuja aferição tem por base critérios de discriminação por exemplo fundados em razões económicas).
Questiono-me o que por aí virá em termos de Sistema de Acesso ao Direito e aos Tribunais.
Questiono-me qual o futuro destinado a todos os Advogados que não integrem grandes sociedades!
Questiono-me se os jovens candidatos a Estagio poderão exercer o seu direito de escolha de profissão!
Questiono-me em que moldes a sociedade ficará mais justa se despojada do acesso a mais de metade dos Advogados actualmente inscritos em Portugal, e em que termos se podem diluir os já nítidos fossos entre uma justiça para pobres e outra para ricos, se, ironicamente, até aos Advogados se pretende proibir a pertença à Classe Média, será a classe média indigna de tal honraria?
Tempos difíceis parecem aproximar-se, estaremos vigilantes, coerentes com a nossa consciência e nunca passivos perante ataques e injustiças, afinal a determinação, a coragem, a capacidade de resistir a abusos é que fazem um bom Advogado, e não o saldo da sua conta bancária! Nunca poderei ser cúmplice de injustiças, e neste caso, calar seria assumir cumplicidade!
" O Homem é o lobo do homem"
Thomas Hobbes
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