“Os políticos parecem esquecer a história
mais rapidamente do que o resto de nós aprende.”
A convite da editora Saída de Emergência, tivemos a
possibilidade de conversar durante a Comic Con 2019, no Passeio Marítimo de
Algés, com o autor Britânico Simon Scarrow sobre o seu livro “O
Sangue de Roma”, traduzido e publicado pela primeira vez em Portugal,
em Agosto deste ano.
Simon Scarrow é um escritor britânico, conhecido
pela sua aclamada série "A Saga da Águia". Antes de se dedicar a
tempo inteiro à escrita, foi professor do Colégio de Norwich. É um especialista
na história militar das guerras napoleónicas, tendo escrito uma série de quatro
volumes centrada em Wellington e Napoleão. O seu mais recente livro
é “O Sangue de Roma”.
MBC – Durante muitos anos foi professor, deixou o ensino
para se dedicar exclusivamente à escrita?
SS – Continuo a ir às escolas falar sobre história, mas não
é a mesma coisa que ser professor, quando estamos diariamente com os mesmos
alunos. Sinto falta desses tempos apesar de ainda dar aulas de escrita criativa.
Sempre gostei de História, mas quando era mais novo nunca pensei em ser
professor apesar de não me conseguir decidir sobre o que fazer, quando me
apercebi que me pagavam para falar do assunto que me movia aceitei. Quando
comecei, rapidamente percebi que abria portas do mundo para os alunos
inspirando muitos deles. É uma experiência realmente humilde sentirmos que
fizemos a diferença. Hoje em dia tenho conhecimento de pessoas que se graduaram
nos clássicos simplesmente porque eram fans dos meus livros.
MBC – Porquê História?
SS – Quando era estudante aprendi Latim, confesso que
nunca fui muito bom aluno porque era realmente uma língua muito difícil. Mas
quando comecei a pensar na história da cultura, soube o que queria fazer.
Comecei a viajar pela Europa e pelo Mediterrâneo e em todos estes locais
encontrei inúmeros artefactos, foi quando me questionei sobre tudo o que via.
Quem tinham sido aquelas pessoas que há dois mil anos nos deixaram, literatura,
instituições políticas, legais. Se por um lado me identificava com o que
descobria por outro ficava horrorizado.
MBC – Foi esse seu fascínio pelo mistério, pela descoberta
que o levou a escrever este livro?
SS – Foi um conjunto de tudo, julgo que posso afirmar que
uma série de peças se alinharam. A única certeza que tinha quando comecei a
escrever é que ia ser uma longa série de livros. O meu editor não sabia quão
longa seria. Escrevi por diversas vezes sobre os Romanos, o poder da Legião que
se estendia a todos os cantos, na Síria, no Egipto, na Bretanha, como estavam
permanentemente em movimento. Quando escrevemos muito sobre um assunto,
percebemos que ao longo da história aconteceu sempre algo que nos leva a pensar
no que acontece presentemente.
MBC – Para quem ainda não
teve a oportunidade de ler o livro, quer levantar um pouco o véu sobre o que o
leitor pode esperar?
SS – Este livro fala de
Partia na Arménia, uma área geográfica totalmente insignificante até o Império
Romano o reivindicar passando a ser simbolicamente e estrategicamente importante.
Não vou adiantar mais na esperança de que o livro fale por si.
MBC – Onde recolhe as suas ideias?
SS – O que acontece por norma é que
sempre que me desloco a algum local para fazer pesquisa acabo por encontrar
ideias para um próximo livro. Dou-lhe um exemplo, fui para Creta com a ideia de
escrever um livro para crianças sobre um menino gladiador. Conduzia pela ilha
com a minha família quando passei por umas ruínas de uma antiga cidade romana
destruída por um terramoto em 49 D.C. No espaço de uma hora já tinha um enredo
na minha cabeça, o mesmo acontece com as personagens, nunca sei o que vai
acontecer até começar a escrever a partir dai são elas mesmas que tomam o
controlo, eu apenas me sento e peço-lhes para abrandarem o passo, diminuírem a
velocidade dando-me tempo para escrever.
MBC – Para os leitores portugueses que
ainda não o conhecem, o que gostaria de lhes dizer
para os motivar para a sua leitura?
SS – Que a História é muito
importante porque nos explica quem somos. Mais do que nunca é essencial, até
porque os políticos parecem esquecer a história mais rapidamente do que o resto
de nós aprende. Não digo que a história se repita, mas existem padrões e ciclos
muito similares e acabamos inevitavelmente a fazer algo muito semelhante ao que
já aconteceu no passado.
Há
dois anos conversava com um oficial do exército Britânico e ele dizia-me que
íamos vencer no Afeganistão. Eu perguntei-lhe porque seria desta vez diferente
se já o tínhamos tentado anteriormente e das três vezes que o fizemos provou
ser sempre desastroso. A resposta dele foi tão simples como afirmar que as
armas que tínhamos actualmente eram melhores. O problema é que ninguém parece
perceber que os afegãos têm uma cultura muito rica apoiada nos senhores da
guerra, em tribos e que nada mudou ao longo de séculos. Podemos ter uniformes
chiques, melhores armas, mas isso não significa que seremos bem-sucedidos.
MBC – Actualmente as pessoas parecem
gostar mais de ler fantasia, o que o leva a pensar que sentirão essa atracção que
me descreve pela História?
SS – Considero a fantasia muito
reaccionária e a ficção científica revolucionária.
A
princesa Leya! Quem a elegeu?
No
entanto a História é interessante porque aconteceu.
É
verdade que em termos de interpretação também pode ser reaccionária particularmente
sobre aspectos gloriosos do passado por isso penso que devemos ser sempre muito
críticos e estar cientes do que lemos.
Quando
Alexandria foi tomada pelo exército muçulmano, basicamente o que estes
militares fizeram foi salvar o que restou da destruição que os cristãos
deixaram atrás de si na biblioteca. Pegaram em todos os documentos que
encontraram e levaram-nos cuidadosamente com eles, traduzindo-os posteriormente
para Árabe. A verdade é que os documentos originais acabaram por se perder, mas
continuaram a existir traduzidos em árabe até os cruzados os encontrarem e os
traduzirem novamente para o Latim. Só temos a nossa cultura ocidental porque os
muçulmanos a salvaram. E agora temos traduções de traduções dos textos
originais.
Infelizmente
alguns documentos perdem-se definitivamente, porém, outros acabam por ser
encontrados por mero acaso.
MBC – Nota grandes diferenças nos
métodos de ensino actuais de quando era professor?
SS
– Demasiadas. Considero
realmente preocupante no actual sistema de educação britânico o facto da
História ser colocada à margem para dar maior visibilidade à matemática e às
ciências. Os alunos deixaram de ter educação para passarem a ser treinados.
MBC – Na actualidade como é que os
britânicos vêm o resto do mundo?
SS – Nasci em África e a minha mulher
foi criada na Papua Nova Guiné, o que notei quando regressei para a
Grã-Bretanha é que independentemente de falarmos a mesma língua de termos as
nossas raízes neste país somos sempre vistos como estranhos. O que realmente me
preocupa é que as pessoas que nascem e crescem nesta específica cultura
convencem-se que o seu pais é o centro do mundo. E a verdade é que existem
outros países, culturas, pessoas e reconhecê-lo não nos torna nem melhores nem
piores, mas o resultado do meio em que somos criados.
MBC – O que pensa do Brexit?
SS – O Brexit revolta-me. Estive em
Espanha antes do referendo e alguns jornalistas na altura perguntaram-me o que
achava sobre este assunto. A minha resposta foi simples, num mundo já tão
dividido não temos necessidade de encontrar mais uma razão para nos dividirmos
ainda mais. Sinto orgulho de ser europeu, de poder viajar livremente. Sinto que
essa liberdade de escolha me está a ser retirada e que não estou a ganhar nada
antes pelo contrário sinto-me um perdedor.
Sinopse:
Cato
e Macro estão de regresso em mais uma emocionante aventura.
O
Império Parto invadiu a província romana da Arménia, derrubando o rei
Rhadamistus. Este é um monarca ambicioso e impiedoso, mas é leal a Roma. O
general Corbulo tem como missão recuperar o poder, ao mesmo tempo que prepara
as tropas para a guerra com o poderoso Império Parto. Mas o exército que lidera
não está preparado para um conflito tão violento, e a chegada de Cato e Macro,
veteranos de várias campanhas, é saudada por Corbulo.
Restaurar
um rei deposto é um jogo perigoso. E a brutalidade de Rhadamistus para com os
que o derrubaram é a faísca para uma rebelião que irá testar até ao limite a
bravura e a vontade do exército romano. Mas, neste jogo de sombras e
interesses, nem todos os inimigos estão no campo de batalha…
Fotos: Mário Ramires
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