- Espera! Não saias. Temos que conversar.
A sua mão já apertava o manípulo da porta, mas parou.
- Não me amas?
Porque lhe perguntava tal coisa? Será que não sabia que aquilo a que chamava amor era sobreavaliado?
- Olha para mim por favor. Diz-me o que queres que mude.
Não queria que mudasse. Só queria sair.
- Todo este tempo juntos e não consegues pensar em mim? No que sinto?
Já tinha passado realmente muito tempo.
- Existe outra é isso?
Existiria sempre outra, outras, não importava.
- Vais ter com ela?
Ainda não sabia o que faria.
- Investi tanto em ti e agora abandonas-me como a um animal.
Não era certo, quando saísse levava o cão.
- E o nosso projecto de vida, vais deitar tudo a perder?
Aquele projecto não era seu.
- As viagens que planeámos fazer.
Tinha no bolso das calças as chaves do carro.
- A casa que sonhámos comprar.
Queria ir para perto do mar, talvez a Marginal.
- Os filhos que contámos ter.
Para ele o tempo nunca seria uma preocupação.
- Vais deixar tudo para trás?
Tentava há uns bons dez minutos, mas ainda não conseguira.
- O que vou dizer aos meus pais?
O que quisesse.
- Á minha família?
Podia fazer um jantar e comunicava ao mesmo tempo, quem sabe com um bom vinho.
- O que vão os nossos amigos pensar?
Que demorei muito tempo.
- Vamos dividir tudo aquilo que comprámos com tantas dificuldades?
Podia ficar com tudo. Odiava particularmente o sofá.
- Não achas que nos devemos mais uma oportunidade?
Não estava a ficar mais novo.
- Vai então, sai como o cobarde que és.
Abriu a porta, assobiou para o cão que veio a correr a abanar a cauda também ele queria sair dali depressa, tinham que aproveitar aquela oportunidade antes que mudasse de ideias.
O silêncio que reinava atrás de si era ensurdecedor. Voltou-se lentamente para olhá-la pela primeira vez desde que aquela ladainha começara.
- Queres vir passear connosco? Já não faz tanto calor e vamos só um pouco para além da curva da estrada.
Pegou no casaco.
Saíram juntos, de mãos dadas, com o coração aquecido pelas diferenças que os uniam. Mais tarde cairiam na cama onde se amariam, dois corpos suados, saciados sem promessas e o dia seguinte seria um novo recomeço com mais algumas diferenças.
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