Dizem que vivemos várias vidas e que nunca nos lembramos delas para que possamos de alguma forma corrigir o que deixámos inacabado. Mas como será possível garantir que desta vez agiremos de acordo com os nossos desígnios? Que desta feita será a última vez que percorreremos o nosso atribulado percurso sem falhar, fazendo desta a nossa última passagem?
Será que as pessoas que nos acompanham agora foram as mesmas que já o fizeram nas nossas vidas passadas?
Gosto de pensar que das vezes que o meu sexto sentido me disse que de alguma forma já as conhecia, que não me tivesse enganado.
Será esta a minha última passagem?
A minha intuição diz-me que não.
Deito-me e fecho os olhos, quero viajar, quero que a minha memória me leve para lá do véu das minhas lembranças, que me permita atravessar a névoa dos tempos e independentemente de quem possa ter sido ter sempre a certeza que estou aqui novamente para acabar o que deixei inacabado.
Sigo por um estreito e escuro caminho, estico as mãos, mas não toco em nada. Tudo à minha volta é vazio, consigo senti-lo.
Fecho os olhos com maior intensidade quero deixar-me levar para lá desse nevoeiro. Quero que se abra para mim e me mostre o que se esconde na infinitude dessas Eras passadas.
Sinto que me vai ser dada a oportunidade de ver o que tanto procuro.
Sou banhada por uma luz forte e quente que me embala no meu caminho. Ofuscada por um calor tão humano e no entanto tão ausente, estou só. Ou não estarei?
Tenho a apurada percepção de que alguém me acompanha, inundada por um amor que não consigo abraçar. Deixo-me levar. Sei que ali estou protegida, cheguei a uma casa há muito abandonada.
Abro os meus sentidos. A minha acutilante perspicácia que sempre me deu conselhos certeiros. Sinto-me segura porém não sei onde.
Fisicamente continuo deitada no meu sofá de olhos bem cerrados.
Pressinto o que vai acontecer mesmo antes que aconteça. Continuo rodeada daquela luz quente e protectora. Sinto que estou perto muito perto de saber quem fui. Deixo-me guiar.
E quando as cerradas névoas se abrem um pouco é-me permitido ver que fui várias pessoas, fui vilã, vivi em reclusão afastada de olhares curiosos, ajudei com o gado, cultivei terras, fui neta, filha, irmã, mãe. Fui amante, esposa. Morri, vi morrer, matei. Fui cobiçada, cobicei. Fui rica, fui pobre. Ajudei, maltratei.
Vivi várias vidas e morri outras tantas.
Vi tudo em flashes.
E antes que me pudesse aperceber fui novamente conduzida para o meio daquela névoa que me afastava da luz quente que de mim se despedia com a promessa de um até já.”
E sempre guiada pelo meu instinto quase sempre infalível e certeiro, abri a medo os olhos. Continuava deitada no meu sofá.
E do fundo das minhas memórias soube que a minha passagem ainda não estava terminada, uma voz persistia na minha cabeça dizendo-me para confiar no meu sexto sentido pois seria ele a levar-me de volta a casa, ao calor das suas almas e à ausência de incertezas.
Sei que elas me esperam.
E quando acabar esta minha nova e não derradeira passagem reencontrarei quem tanto me ama e protege.
O sexto véu dos sentidos.
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