Há já alguns dias que tudo se repetia. Todas
as noites J. tinha o mesmo sonho, um sonho persistente que o fazia acordar sistematicamente
sobressaltado, ofegante e a transpirar. Já não conseguia regressar à cama e
voltar a dormir, de boxers e roupão vestido, ia até à cozinha, enchia uma
chávena de café bem quente e ficava horas na escuridão da sala, sentado no sofá
sobre o vazio da noite. Nunca mais conseguia sossegar, aquele sonho, parecia
persegui-lo.
Via e revia tudo tempos a fio. Tudo
começava com um cenário todo branco, paredes brancas, sem nada, uma cama ao
centro, um nevoeiro esfumado no ar que fazia com que não conseguisse vislumbrar
mais pormenores. Do nada aparecia um vulto feminino, belo e esbelto, longos
cabelos loiros, sorriso fácil e de lingerie branca. Lentamente ia-se
aproximando dele, e num único movimento, puxava-o para si a partir do decote da
camisa axadrezada que trazia vestida, para depois o empurrar bruscamente de
encontro à cama e assim possuí-lo sofregamente noite dentro. E era assim que
tudo começava.
Por entre beijos intensos e carícias,
roupa que voava em direcção ao chão, a mão que acariciava cada fio de cabelo
dela, que explorava o corpo dela. Os lábios carnudos dela, que lhe humedeciam a
pele, as mãos suaves, doces e ternas que percorriam o seu corpo, lhe apertavam
a pele e a carne e que o faziam gemer e contorcer-se de prazer, atingindo o
clímax, num orgasmo fervilhante. Como adorava as curvas dela, percorrê-las,
senti-las, os seios perfeitos, simétricos e quentes que faziam faísca na
humidade e frescura dos seus lábios, no suor libertado pelo corpo dela, o
ventre duro e macio, desalinhado como as dunas no deserto. A excitação no seu
auge. Aquele amor despido, carnal, intenso, vivido no limite, a necessidade e
saciedade de um corpo, de contacto físico.
De repente, ela levanta-se, deixando
praticamente tudo a meio, ainda havia sensações, cheiros e aromas para explorar
e descobrir, nua, sem mais nada que a protegesse, veste a camisa dele. Acena,
atira-lhe um beijo e difunde-se na névoa.
J. acorda, e é assim que tudo termina
todas as noites, sem mais nenhum detalhe a acrescentar, mas desta vez, tudo foi
diferente. Encontra nas costas da cadeira a sua camisa, a camisa do sonho, e de
repente sem nada que o fizesse prever… sente o cheiro dela.
Sorri, veste a camisa. E sai…
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