domingo, 28 de junho de 2020

DIVULGAÇÂO LITERÁRIA | LIVRO DE VOZES E SOMBRAS, de João de Melo - DOM QUIXOTE

Nas livrarias a 30 de Junho


Cláudia Lourenço, jornalista, é enviada de Lisboa à ilha de São Miguel ao serviço do Quotidiano. Tem por missão entrevistar um conhecido ex-‑operacional da Frente de Libertação dos Açores e reaver a crónica do independentismo insular durante a Revolução. Depara-se-lhe um homem-‑mistério, voz e sombra do jogador, das suas verdades que mentem, das suas mentiras que dizem a verdade. Ela, que pertence à «geração seguinte», não parece ter memória histórica do país de então: vive no de agora, e o passado é um território longínquo, cuja narração flui no interior de um imaginário algo obscuro. A história da FLA (e a da FLAMA, na Madeira) comporta em si o «país de todos os regressos»: a Ditadura, o fim das guerras em África, a descolonização e o «retorno» à casa europeia pelos caminhos de volta, os mesmos que levaram as naus a perder-se nos mares da partida. O país que a si mesmo se descoloniza vibra na exaltação revolucionária. E é dos avanços e recuos dessa Revolução que nasce a tentação separatista do arquipélago.
Uma narrativa triangular cujos vértices e sequências assentam sobre Lisboa, África e Açores.


sábado, 27 de junho de 2020

O SÓTÃO, de Fernando Teixeira















Entrou, accionou o interruptor de uma lâmpada mortiça e, inexplicavelmente, porque vivia sozinho, fechou a porta à chave pelo interior. Talvez esse gesto, mecânico ou pensado, só ele o poderia dizer, fosse indicativo daquilo que se propunha fazer naquele espaço da casa que fora o seu local de trabalho, mas também de lazer, durante décadas. Como se o rodar da chave, na fechadura da porta, criasse uma barreira de que necessitava para se sentir protegido de olhares invisíveis, isolando-o de censuras ocultas.
À medida que os anos lhe atravessavam a velhice e lhe pesavam nas pernas, cada vez mais evitava subir as escadas de acesso ao sótão, tanto assim que, providencialmente, mudara alguns livros para a salinha térrea, literatura que o ajudava a consumir o tempo quando a meteorologia não lhe permitia dar pequenos passeios pelas ruas empedradas da aldeia, sempre com o propósito de encontrar alguns conterrâneos para dois dedos de conversa.
Abriu as portadas de uma janela, depois as de outra oposta, permitindo que o espaço se inundasse de luz diurna e revelasse melhor duas paredes revestidas de estantes corridas, com tudo o que permanecia ali: obras literárias, revistas antigas, livros técnicos, sebentas, dossiers cheios de legislação e regulamentos, esboços, apontamentos, projectos e trabalhos realizados ao longo de uma vida profissional. Memórias…
Apagou a lâmpada incandescente e, por alguns momentos, deixou-se ficar estático no meio do sótão, olhando uma e outra estante, submergido pela visão de dezenas e dezenas de volumes, uma enorme quantidade de papel, parte dele amarelecido pelo tempo e pelo pó, sem saber muito bem por onde começar. Como se o seu corpo franzino ganhasse outro peso sobre o chão de tábuas corridas, dificultando-lhe o primeiro passo.
Desviou o olhar para uma secretária de madeira escura, num canto junto a uma das janelas, ainda com algumas canetas e utensílios de escritório, ali esquecidos. Com um leve sorriso, apenas um esgar de recordação, lembrou-se de uma vez em que uma das suas namoradas, por sinal uma das mais bonitas e meigas, também algo atrevidota, e como ele gostava disso, se sentara de saia plissada no bordo do tampo e o puxara para si. O que se seguira, não o esquecera nunca, emergia quando ali ia, embora o tempo se tivesse encarregado de tornar esse momento de êxtase numa aguarela esbatida.
A recordação teve o condão de o incentivar. Tinha dedicado essa manhã para iniciar a tarefa a que se propunha, continuá-la-ia durante a tarde e, sabia-o bem, iria necessitar de outras manhãs e tardes para a concluir. Mas a idade ensinara-o a fazer as coisas sem pressa.
Decidiu deixar o que lhe parecia mais fácil para o fim. Reservaria alguns livros de literatura para oferecer à Biblioteca da Junta de Freguesia, inaugurada dois anos antes. Conservaria consigo aqueles que mais estimava, alguns romances “clássicos” e outros que lera mais do que uma vez, ou que tinham algum significado especial para si.
A parte complicada da arrumação era seleccionar o que descartar nesta fase da sua vida. O que já não interessava, aquilo em que nunca mais iria mexer, tudo o que só estava ali para ganhar pó e poder ser atacado pelo bicho do papel, o chamado “peixinho prata”, como é que alguém poderia apelidar simpaticamente aquilo de peixinho?
Hesitante, foi tirando um ou outro livro técnico, um ou outro dossier, abrindo e folheando, pondo de lado, separando em montes na secretária, aqui e ali pelo chão, rasgando folhas então inúteis para o lixo. Em cada gesto, porém, a sensação de que era um pedaço de si que se separava, uma parcela do seu passado, uma parte da sua história a ser rasgada ao ritmo das folhas, a ser posta de lado, apagada da sua vida.
Contudo, alguns dossiers e vários livros irão voltar do chão e da secretária para as estantes, pois desfazer-se disso, mesmo sabendo que deles nunca mais irá precisar, e por muita coragem que possa ter, cortar esse cordão umbilical com a vida passada seria morrer antes do tempo.

(O autor escreve segundo a ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.)

DIVULGAÇÃO LITERÁRIA | O ÚLTIMO VERÃO DE KLINGSOR, de Hermann Hess - DOM QUIXOTE / Tradução de Patrícia Lara


Nas livrarias a 30 de Junho

Escrito pouco depois do fim da Grande Guerra, O Último Verão de Klingsor relata a história de um famoso pintor, Klingsor, que vive uma explosão final de criatividade no último verão da sua vida.

Pintor expressionista orientado pela emoção, a entrega de Klingsor à arte é total pois considera que esta corporiza a essência da vida.

Amante dos extremos, opõe-se violentamente à moderação e à mediocridade. Não gosta de planear nada com antecedência pois não acredita no amanhã e vive cada dia como se fosse o último. Na vida tem apenas dois pontos centrais de interesse em que é bem-sucedido: criar arte e amar.

Como Demian, Siddhartha, Goldmund e Joseph Knecht, Klingsor não é uma personagem vulgar. Atingiu um patamar de sucesso fora do comum na arte que escolheu e trabalha intensamente para manter esse nível. E, tal como outros heróis dos livros de Hesse, luta por trilhar o seu percurso individual e único para atingir o fim que se propõe na vida.

segunda-feira, 22 de junho de 2020

CRÍTICA LITERÁRIA | "Onde o Desejo de Esconde", de Nora Roberts | Chá das Cinco - Grupo Saída de Emergência


Texto: Isabel de Almeida | Crítica Literária | Jornalista | Editora

Foto: D.R.


Onde o Desejo se esconde é um trepidante thriller romântico escrito com a mestria a que Nora Roberts já habituou os seus fãs, sendo o segundo romance da série D.C. detectives, cuja acção decorre em Washington.

Nesta obra com um enredo bem tecido, pautado por acção, perigo, violência, crime, mas também muita paixão e romantismo, numa combinação perfeita entre todos estes ingredientes, encontramos como protagonista feminina Grace MacCabe, uma famosa escritora de policiais, que se desloca à capital dos Estados Unidos, em visita à irmã - Kathleen, Professora que atravessa uma fase menos boa na vida, na sequência de um divórcio complicado que pôs fim ao casamento, algo de fachada, com o pretensioso e arrogante advogado Jonathan Breezewood III.

O caminho de Grace irá cruzar-se com o do detective Ed Johnson, que reside no bairro simples onde habita Kathleen, e ainda que com muitas reticências de Ed e do seu colega Ben Paris (protagonista do primeiro livro da série), a escritora decide envolver-se activamente numa investigação que pretende descobrir a identidade de um perigoso assassino em série que escolhe as suas vítimas entre as operadoras de uma empresa de telefonemas eróticos.

É curioso ir assistindo ao desenrolar da trama, com inúmeros momentos de tensão, e assistirmos ao nascimento da cumplicidade crescente entre Grace e Ed, duas personalidades fortes mas muito díspares, à medida que vamos também penetrando na mente perturbada do assassino e das suas vítimas.

Um livro que é puro entretenimento, que se lê num ápice, mas que nos leva a pensar em diversos temas próprios das sociedades modernas, como o impacto das novas tecnologias no dia a dia e na vivência da intimidade. Podemos indagar sobre que factores podem levar uma mulher a tornar-se operadora de linhas eróticas? - rendimento extra, viver fantasias adoptando uma espécie de alter ego e fugir, assim, à rotina do quotidiano, e também, no reverso da medalha, o que levará os homens  a usufruir deste tipo de serviço? viver uma realidade paralela e proibida sem consequências de maior na vida familiar, dado não haver ligação emocional nem contacto físico? Procurar uma alternativa de conforto para a solidão e para a rotina? Viver uma identidade alternativa onde poderá idealizar-se a si mesmo e ao outro de modo mais gratificante?

Muito interessante foi também a forma como Nora Roberts construiu a personagem do assassino em série, pois a pouco e pouco, vamos penetrando no seu contexto familiar, e ficamos com a noção de que, por vezes, nem sempre o que parece um modelo de família perfeito acaba por se revelar enquanto tal. Em termos psicológicos, encontramos no assassino um homem que tendo tido problemas em construir uma identidade própria, e tendo dificuldade em seguir e acompanhar um modelo parental bastante poderoso e marcante, encontra no crime, e na relação de fantasia sexual que estabelece com as suas vítimas, uma forma de afirmar o seu poder e de provar a sua grandiosidade e inteligência, desafiando também as autoridades.

Temos, pois, aqui um romance que pode ter várias leituras, mas que satisfaz plenamente quem procura uma história marcante, mas com muito romantismo à mistura, e cuja leitura se recomenda.



Ficha Técnica do Livro:



Autora: Nora Roberts

Edição: Julho de 2015

Editora: Chá das Cinco [Saída de Emergência]

Nº de Páginas: 288

Género: Thriller Romântico


Classificação: 4/5 estrelas



ESPAÇO PSY |Tudo ficará bem... Liberte-se do medo, saia do caos, diga não ao desespero!, | Reliane de Carvalho



Texto: Reliane de Carvalho
Hipnose Clínica e Regressiva

Foto: D.R.

O mundo pede o silêncio da esperança... E o nosso coração pede o refúgio da paz. Feliz daquele que acredita mais na luz da vitória do que no desespero da derrota...

"Sejamos a voz da certeza de que tudo ficará bem, porquê a dúvida dilacera o nosso coração e leva-nos ao pior abismo que podemos ir, o do medo, o do terror, o da prisão dentro da ansiedade na nossa mente"...

Sim, foi um vírus que veio e teve o poder de estremecer o mundo, foi um vírus que veio e teve o poder de nos fazer temer, foi um vírus que veio o nos tirou do conforto de nossas vidas, adiou muitos de nossos projetos, adiou a realização de sonhos, e levou-nos ao arremesso da dor, da tristeza, da lamentação.

Agora a maior conclusão de que podemos chegar é o que vamos fazer com tudo isso: Ficar presos ao destroço desta tempestade que assola a nossa realidade ou seguirmos confiantes, em esperança, crentes de que logo tudo isso vai passar e que temos dentro de cada um de nós capacidade para tudo transpor? Para pegar cada tijolo de dificuldade gerado e reconstruir? Por que estamos a acreditar na perda antes mesmo de acreditar que unidos vamos ser capazes de reconstruir? Porquê estamos já presos a energia de morte enquanto a vida ainda habita dentro de nós e gratos deveríamos estar porquê não fomos um destes viajantes que este vírus levou, para talvez algo forte nos ensinar? Porquê somos muitas vezes inaptos a realizar a crença positiva e ficamos presos a dor, as lamentações, aos murmúrios, ao terror?

Sejamos força de construção, sejamos a certeza de que vamos conseguir vencer, sejamos a energia do amor, sejamos a luz da esperança, porquê se cada um de nós acreditar que tudo ficará um caos, já estamos a construir no hoje o caos que tememos no amanhã. Deixemos nós para viver a dor quando ela chegar. O que importa é o agora, o que importa é cada um de nós fazermos a nossa parte para que tudo fique bem, para nos protegermos e protegermos quem a nossa volta está. Sejamos cada um de nós a força motriz da crença positiva, porquê quem fica preso ao medo, as dores, as lamentações, está a viver a pior morte que pode existir que é a morte em vida...

E quando tudo isso passar, talvez possamos acreditar, que aquilo que não nos mata, fortalece-nos, ensina-nos, reconstrói, e feliz de cada um de nós que poderá ficar para depois testemunhar que no passado vivemos sim momentos difíceis, mas ricos o suficiente para nos ensinar a sermos seres humanos mais fortes, mais conscientes, mais solidários, e acima de tudo, mais otimistas...

Porquê aquele que não acredita na vida, que não vive a vida e o que é positivo, está com medo de que morte? Qual é a pior morte? Para mim é a morte em vida, aquela que não vê luz no caminho que só se atém a escuridão da crítica, da culpa do outro, da responsabilização. Aquela que vive a escuridão da incerteza, aquela que vive o peso das lamentações, aquela que vive a tristeza de constantes desilusões, aquela que chora, lamenta, reclama e não é capaz de agradecer. Aquela que vive a sombra do medo ao invés de viver a força da verdade. Aquela que vive no amanhã sem pensar no hoje, sem sentir o hoje, sem fazer a sua parte para si, para o outro, para a vida... O que é a morte, se não o jogar fora a nossa grande oportunidade de crescimento para a partir do gerenciamento de cada uma de nossas emoções, que nos permite ter a transformação de que necessitamos para a nossa alma evoluir? Pensemos nisso, talvez o pior vírus que possa existir é a prisão que impomos a nós mesmos, quando estamos com medo de lutarmos pelas nossas transformações pessoais. E assim vamos seguindo, a viver a morte sem sentir a vida que é viver em consciência, em plena sintonia com a nossa alma, com a nossa verdadeira essência de amor, em plena sintonia com o nosso "Eu superior"...


Visite o Site da Dra. Reliane de Carvalho:



CITAÇÕES | Autor Fernando Teixeira


domingo, 21 de junho de 2020

DIVULGAÇÃO LITERÁRIA | " A Cidade das mulheres", de Elizabeth Gilbert | SUMA DE LETRAS


Texto: Redacção e Grupo Penguin Random House

Foto: D.R.

Chega dia 23 de Junho às livrarias a mais recente obra da autora Elizabeth Gilbert, conhecida mundialmente pelo livro "Comer, Orar e Amar" que chegou aos ecrans do cinema.


  1. Sobre o livro:


No Verão de 1940, aos 19 anos, empurrada pelo desespero dos pais, Vivian Morris chega a Manhattan levando consigo apenas uma mala e uma máquina de costura. Embora pouco apreciados na prestigiada Faculdade de Vassar, o seu especial talento com as agulhas e a sua dedicação para lograr o penteado perfeito acabaram por transformá-la na estilista estrela de Lily Playhouse, o decadente teatro de variedades da sua nada convencional tia Peg.

 Apesar da guerra, os dias em Nova Iorque são tudo menos aborrecidos. Nesta cidade das mulheres, Vivian e as suas amigas tentam ser livres e beber a vida até à última gota. Mas ela também descobrirá que tem lições para aprender e amargos erros para cometer e que, para viver a vida que verdadeiramente deseja, terá de se reinventar a cada passo.



«Gilbert desenha um perfil fascinante das aventuras da jovem Vivian, abordando temas intemporais e muito oportunos, como a liberdade, a responsabilidade e o empoderamento.»  Time



«Um romance glamouroso, sexy, fascinante e divertido. Uma história viciante com personagens femininas cheias de intensidade e traçadas sem pudor. Radical e refrescante.»Sunday Times

FICHA TÉCNICA DO LIVRO:


Título: A Cidade das Mulheres

Autora: Elizabeth Gilbert

Editora: Suma de Letras - Grupo Penguin Random House

Edição: Junho de 2020

Páginas: 400

Género: Romance Feminino




DIVULGAÇÃO LITERÁRIA | "Nas asas de um coração", de Sylvia Day | 5 Sentidos - Grupo Porto Editora


Texto: Redacção e Chá das Cinco

Foto: Chá das Cinco | D.R.

No próximo dia 25 de Junho chega às livrarias mais um romance de Sylvia Day, a famosa autora da Série Erótica CrossFire, novamente com chancela Cinco Sentidos, do grupo Porto Editora.

Nas asas de um coração promete romantismo e erotismo em doses sabiamente combinadas como é hábito encontrar nas obras desta versátil autora já muito conhecida entre o público Português. Leitoras preparem os vossos corações!

SINOPSE DA OBRA:

Nunca me teria imaginado aqui. Mas cá estou eu: num lugar que adoro, numa casa que renovei, a fazer novas amizades - pessoas que me fazem feliz - e a trabalhar num projeto que me realiza. Estou a reconciliar-me com o passado e a preparar-me para o futuro.É então que Garret se muda para a porta ao lado.

Obstinado e arrojado, ele é uma força da natureza que atrapalha a ordem da minha vida. Reconheço os fantasmas que o assombram, o tormento que transporta no coração. Garrett seria sempre um risco, mas ferido como está, ele é ainda mais perigoso. E eu temo ser demasiado frágil para a tempestade que se alastra dentro dele, delicada demais para suportar a dor que o aflige. Mas ele é muito determinado ... e muito tentador.


SOBRE A AUTORA:


Sylvia Day

Sylvia Day é autora n.º1 nas listas do New York Times e bestseller internacional de cerca de 20 romances premiados e publicados em mais de 40 países. É autora bestseller em 27 países e conta já com dezenas de milhões de livros impressos em todo o mundo. Sylvia Day foi nomeada para "Melhor Autor" pelos Goodreads Choice Awards.
A série Crossfire, de sua autoria, foi adquirida pela Lionsgate para uma adaptação para televisão.

FICHA TÉCNICA DO LIVRO:


Autora: Sylvia Day

Tradutora: Cláudia Ramos

Editora: Cinco Sentidos [Grupo Porto Editora]

1ª Edição: Junho de 2020

Páginas: 208

Classificação: romance contemporâneo





CRÍTICA LITERÁRIA | " O Sedutor", de Madeline Hunter | ASA - Grupo LeYa


Texto: Isabel de Almeida | Crítica Literária | Jornalista | Editora

Foto: Asa, Grupo LeYa, Direitos Reservados

  "O Sedutor" corresponde ao início de uma nova série, e se é certo que as expectativas eram elevadas, as mesmas não sairam defraudadas com esta leitura.

   Madeline Hunter escreve romances que podemos inserir no género histórico [ou de época, se preferirem] sensual, um estilo literário bastante em voga na actualidade, mas que nos transporta até ao século XIX, neste caso, não apenas até ao Reino Unido [o mais frequente espaço da acção neste tipo de narrativas] mas com início em França [inicialmente num colégio interno, e mais adiante em Paris], o que, por si só, já é um pormenor mais rico e diferente do habitual.

   Estando bastante familiarizada com este género literário, do qual sou admiradora confessa e leitora compulsiva, foi com enorme satisfação que detectei no estilo de escrita de Madeline Hunter uma linguagem bastante formal, a qual confere uma melhor construção contextual à história narrada, atendo o período histórico em que  actuam as personagens.

   Mas apesar de toda a formalidade colocada nas falas das personagens, a autora não esquece a dinâmica da história, nem a torna chata, apenas nos transporta directamente para o ambiente da época e todos os seus maneirismos e rituais.

   As personagens principais são marcantes, Diane Albret, a órfã de quem Daniel St. John é tutor, em circunstâncias misteriosas, são bastante profundas psicologicamente, e ambos se revelam determinados nos seus intentos, com personaldades bastante fortes.

   Diane quer encontrar as suas origens [que sente estarem associadas a Inglaterra, e não a França, onde foi criada num colégio interno de ambiente bastante severo].

   Daniel, belo, sensual, aparentemente frio e muito enigmático, deixa as leitoras rendidas muito também devido à aura de mistério que, até momento bastante avançado da narrativa, a autora soube deixar que envolvesse esta personagem.

   Movido por planos de vingança, Daniel começa por ver em Diane um mero instrumento para alcançar os seus objectivos, mas as regras do jogo irão inverter-se ao nascer entre os dois uma fortíssima atracção, que inicialmente, ambos jamais julgariam ser possível.

   O livro contém algumas cenas de teor sensual, as descrições de cariz sexual são bastante mais "soft" do que aquelas que estamos habituadas a ler em outras autoras [e.g. Cheryl Holt, Kate Pearce, Jennifer Haymore ou Nicole Jordan], mas o que se perde em crueza da descrição, ganha-se em beleza e forte tensão emocional, o que acaba por ser uma mais valia para as leitoras mais românticas, e torna este livro a obra ideal para quem se queira atrever a estrear-se neste género de leitura.

   Irá Daniel conseguir concretizar a sua vingança? Será ele capaz de sacrificar Diane, e abdicar dos sentimentos que esta fez despertar? E Diane irá desvendar o mistério da sua família? Estas são algumas das questões que vos deixo em jeito de provocação.

  Em 2020 chega às livrarias a continuação desta série, com o título "O Santo", também com Chancela ASA, portanto sugerimos a releitura do primeiro livro e a leitura do segundo.


Site Oficial da Autora Madeline Hunter 


FICHA TÉCNICA DO LIVRO:
Título: O Sedutor

Autora: Madeline Hunter

Título Original: The Seducer

Editora: ASA [Grupo LeYa]

1ª Edição: Outubro de 2012

Páginas: 368

Género: Romance sensual de época

Classificação: 4/5 estrelas






DIVULGAÇÃO LITERÁRIA | RUA DE PARIS EM DIA DE CHUVA, de Isabel Rio Novo - DOM QUIXOTE

Nas livrarias desde 24 de Março


Na capital francesa, vivem-se tempos de profundas transformações, com a abertura dos grandes bulevares e o despertar de uma nova corrente artísti­ca, o Impressionismo, que irá alterar o olhar dos indivíduos sobre a arte e o mundo. Mas que história de amor à distância poderão experimentar o prota­gonista deste romance – um diletante chamado Gustave Caillebotte, amigo e mecenas de pintores como Monet e Renoir e, afinal, ele próprio um artista de primeira linha – e a sua Autora, que há anos persegue a história deste milio­nário triste e decide agora escrever sobre ela? E que papel desempenha nessa relação a enigmática Helena, uma professora de história da arte que parece saber tudo sobre Caillebotte?

Combinando o impulso histórico com a tentação do fantástico, Isabel Rio Novo – duas vezes finalista do Prémio LeYa – oferece-nos com Rua de Paris em Dia de Chuva uma peça literária fascinante acerca do poder da arte, que a confirma como uma das vozes mais relevantes da ficção portuguesa contemporânea.

sábado, 20 de junho de 2020

DIVULGAÇÃO LITERÁRIA | RECORDAÇÕES DO FUTURO, de Siri Hustvedt - DOM QUIXOTE / Tradução de Tânia Ganho

Nas livrarias a 23 de Junho

Com 23 anos e o objetivo de escrever um livro, S. H. troca o interior rural dos Estados Unidos por um esquálido apartamento na exuberante Nova Iorque dos anos 70. Todos os dias, para combater a solidão e a fome, a rapariga parte à descoberta da cidade, que na época é suja e perigosa e repleta de aventuras. Tem como única companhia os heróis literários da sua adolescência – Dom Quixote e Tristram Shandy – e a voz de uma vizinha, Lucy Brite, que todas as noites lhe chega através da parede da sala, entoando um triste cântico e monólogos bizarros, que S. H. aponta num diário. A misteriosa Lucy rapidamente se torna uma obsessão.

Quarenta anos depois, a reputada escritora S. H. encontra o seu velho diário e o rascunho de um romance inacabado. Justapondo os diver¬sos textos, ela cria um diálogo entre os seus diferentes «eus» ao longo das décadas, num jogo que transforma a narradora – e o leitor – numa espécie de Sherlock Holmes (S.H.) em busca da verdade possível entre a memória e a imaginação.

sexta-feira, 19 de junho de 2020

CRÓNICA | A MÃE, de Anita Dos Santos


Texto: Anita dos Santos

Foto: Direitos Reservados


Suspirou enquanto levava a mão à testa para afastar o cabelo, que já começa a ficar branco, para trás. Estava a moer milho na seira com a pedra de moer, dava uma farinha amarela densa com a qual contava ir fazer umas papas para dar às crianças. Tinha conseguido aqueles escassos punhados de grãos com o pouco dinheiro que tinha, senão não teria nada, uma vez mais, para lhes dar. Crianças… Já eram todos homens, até a Diamantina já era uma mulherzinha só a pequenina era ainda uma criança.
Tinham de crescer cedo e depressa, e fazer-se à vida. Era assim.
Nas poucas vezes em que tinha tempo para pensar nos tempos em tinha conhecido o Zé, parecia-lhe que tinham sido outras pessoas, não eles os dois, que tinham vivido aqueles dias de amor louco.
Quem havia de pensar que o Zé Cartaxo se iria embeiçar com a Mariana Joaquina?
O gigante e a mulher pequenina. Eram dois opostos. Mas depois de se terem conhecido não se tinham largado mais.
Mesmo os primeiros anos de casados tinham sido bem bons, se comparados com a vida de agora.
A música tinha sido mais uma coisa a juntá-los. Não havia baile a que faltassem.
Todas as mulheres a olhavam de lado quando a viam dançar com o Zé, moda atrás de moda, sem falhar um só passo, sem parança ou cansaço.
Ela era leve como uma pena, dizia-lhe ele.
Bons tempos…
No casamento da prima Arminda, que durou alguns dias, ele rompeu a sola das botinas novas a dançar com ela. Nunca se irá esquecer desses dias por muitas provações que passasse.
Curva as costa sobre a seira, e roda a mó com vigor dentro da desta para afastar as lembranças.
Guardou um pão do dia anterior, ainda bem. Assim pode fritá-lo aos bocadinhos na banha para misturar nas papas. Eles vão bater-se por eles. Tem de ver se a pequena apanha algum.
Ainda não teve tempo para passar um bocadinho de tintura nas pisaduras que tem na cara e nos braços… Já estão a ficar escuros… Paciência.
Só espera que ele naquele dia não chegue bêbado outra vez.
Que ele vá para o mar depressa.


segunda-feira, 15 de junho de 2020

CRÍTICA LITERÁRIA | "Indiscrição", de Charles Dubow | PLANETA


Texto: Isabel de Almeida | Editora | Crítica Literária | Jornalista

Foto: Planeta Manuscrito - D.R.


Indiscrição é o romance de estreia do autor Norte Americano Charles Dubow, que nos surpreende com uma obra de rara qualidade literária, um romance contemporâneo que conjuga diversos elementos marcantes, numa sábia combinação de emotividade, intimidade, amor, amizade, valores familiares vivenciada por personagens extremamente densas e bem construídas.

  A narrativa começa por nos dar a conhecer o núcleo central de protagonistas, o escritor de sucesso Harry Winslow, a sua bela esposa Maddy [um casal com uma elevada posição social aos níveis financeiro e intelectual], e o amigo de toda a vida de Maddy - Walter Gervais, um rico advogado, secretamente apaixonado por Maddy,desde a juventude, tendo ambos crescido lado a lado, que assume o papel de narrador participante, dando a conhecer a história da família Winslow, que integra também o frágil Johny, uma criança com uma doença congénita do foro cardíaco que vem ultrapassando obstáculos da rotina diária muito por força dos cuidados dispensados pelos pais, em ambiente protector, sendo também protegido pelo Padrinho Walter.

  A este leque de personagens, somar-se-à a jovem Claire, esta começa por naturalmente e por força do acaso, integrar o círculo de amizades do casal Winslow, que com ela trava conhecimento na região dos Hamptons, onde Maddy tem uma casa de família na qual se reúnem amigos para conviver e saborear os sofisticados pratos gourmet cozinhados pela anfitriã.

   Sucede que as vidas dos nossos protagonistas ver-se-ão alteradas para todo o sempre, devido a uma infidelidade cometida e ocultada por Harry, levando Maddy a perder a confiança no marido e a reclamar a separação.

   Walter, conhecedor em primeira mão do drama familiar a que vai assistindo, acaba por nos dar a conhecer os detalhes mais íntimos da traição de Harry, afinal a "Indiscrição", que dá o título ao romance, decorrendo a acção em locais como Os Hamptons e Nova Iorque, Roma e mesmo Paris.

   Curiosamente, é difícil  em cada momento, é difícil não simpatizarmos com cada uma das personagens, mesmo quando não aprovamos os seus comportamentos, sendo estas vítimas das circunstâncias, presas pelas redes do amor [legítimo e ilegítimo, assumido ou secreto, mas que acaba por ser este sentimento o verdadeiro protagonista supremo de toda a obra, assumindo sempre posição de destaque e servindo de força motriz ao evoluir da narrativa].

   Maddy é a perfeita esposa e mãe, que vê o casamento e a confiança depositada no marido esfumar-se por entre os dedos como se fosse um conjunto de grãos de areia, acaba por ter de reaprender [melhor ou pior] a viver uma nova vida, e sente-se mais revoltada pela mentira, e pelo facto de a traição ser também emocional e não apenas física.

   Walter acaba por ser o amigo de todas as horas, como que o anjo da guarda de Maddy, mas que experimenta no seu íntimo a frustração de um amor nunca exteriorizado nem concretizado, nunca desenvolvendo relações afectivas estáveis nem constituindo família, e considerando-se mais um membro da família de Maddy, até por ter sido convidado por Harry e Maddy para padrinho do filho do casal.

   Claire é uma jovem imatura, ainda a descobrir como construir o seu próprio percurso, e que anseia por encontrar a estabilidade emocional desejada. Há nesta personagem uma certa ingenuidade, e nítido conflito interno.

   Harry é um escritor de sucesso, devido a um erro, vê-se perdido, sem saber que rumo tomar, e sofre ao amar duas mulheres, talvez pelas distintas essências de cada uma delas, provavelmente, uma é amada por inspirar a sensualidade e arrebatamento das novas relações, o desafio do fruto proibido [a quebra de regras sociais], a necessidade de protecção; outra é amada por ser a companheira de toda uma vida, a mãe de um filho comum, a amante, melhor amiga, uma mulher forte, sempre presente e sempre disponível para sacrificar os seus próprios interesses em nome da verdadeira admiração que nutre pelo marido.  Harry acaba por ceder ao espírito boémio e provocador dos artistas, mas sofre perante as suas dúvidas, hesitações e arrependimentos.

   Emotivo, envolvente, e com um final verdadeiramente surpreendente e emocionante, este é um romance que nos faz pensar na forma como os seres humanos gerem os seus afectos.

    O facto de o romance decorrer dividido em quatro estações, acaba por se revelar uma metáfora das fases da vida humana, e do modo como cada indivíduo escolhe os caminhos a seguir no respectivo ciclo de vida.

   Será o amor o que nos move para o bem e para o mal? Um livro sabiamente perturbador!


Ficha Técnica do Livro:

Título: Indiscrição

Autor: Charles Dubow

Editora: Planeta

Edição: Maio de 2013

Páginas: 280

Género: Romance contemporâneo

Classificação: 5/5 estrelas




CITAÇÕES | Autora Anita Dos Santos


domingo, 14 de junho de 2020

CRÍTICA LITERÁRIA | "Café Amargo", de Simonetta Agnello Hornby | CLUBE DO AUTOR



Texto: Isabel de Almeida | Editora | Crítica Literária | Jornalista
Foto: D.R. Clube do Autor




" (...) embora devesse dar prioridade à instrução dos filhos varões em relação à sua adorada filha, encorajava-a a considerar-se igual a qualquer outra pessoa e a fazer-se respeitar, numa realidade em que era impensável as mulheres terem direito a voto."

Café Amargo, da autora Siciliana Simonetta Agnello Hornby é um brilhante romance histórico que nos traça o percurso de vida da protagonista - Maria - uma mulher forte, determinada, e que sempre lutou para conciliar da melhor forma a rígida tradição cultural da Sicília que secundariza o papel da mulher, afastando-a de questões como a cultura ou a política, com a sua mentalidade mais aberta, o seu espírito naturalmente curioso, a sua paixão pela música e pelo conhecimento em várias áreas, fruto dos princípios transmitidos pelo seu progenitor - Ignazio Marra, um Advogado socialista fiel à causa política que abraçou.

A acção vai acompanhando, com detalhes que resultam de um apurado trabalho de investigação documental, três momentos distintos da história da Sicília (e de Itália), o final do Século XIX ( quando se inicia a trama) quando os grandes proprietários começam a ver chegar ao fim o sistema económico feudal que ainda persistia na ilha; a I Guerra Mundial e o pós-guerra, a ascensão do Regime Fascista de Benito Mussolini; a II Guerra Mundial e os violentos bombardeamentos que deixaram um rasto de destruição na Ilha, em especial na bela cidade de Palermo.

A obra é também, assumidamente, uma saga familiar, e reúne um extenso leque de personagens principais e secundárias, apresentando complexidade nestes laços familiares que, também eles, sustentam de forma exímia a intriga e diversos conflitos inerentes ao desenvolvimento da acção, por isso, pareceu-nos bastante pertinente e útil o Índice das personagens principais que a autora inseriu no final da obra (páginas 353 e 354 na edição Portuguesa).

Os Marra, de que é representante o Patriarca Ignazio, são uma família tradicional com modestos recursos económicos, têm quatro filhos: Maria (a nossa protagonista), Filippo, Nicola e Roberto e acolheram no seu seio Giosuè  Sacerdoti (filho de Tonino, um Judeu de Livorno, amigo de Ignazio que faleceu mas antes pediu que este cuidasse do filho), Maricchia e Egle Malon (também acolhidas por caridade). Ignazio casou-se com Titina Tummia (muito mais jovem que ele e originária de uma família nobre que nunca viu com bons olhos esta união matrimonial) e vivem uma sólida relação amorosa que os faz enfrentar juntos todos os obstáculos que vão surgindo, inclusive, o facto de Ignazio, apesar de ser um excelente Advogado, ser muitas vezes ignorado por potenciais clientes devido à sua visão política.

Os Sala são uma família rica e influente, proprietários de minas de Enxofre e de um vasto património, e irão ficar ligados aos Marra através do casamento entre Maria  Marra e Pietro Sala, que se apaixona à primeira vista pela bela jovem que vê pela primeira vês em casa do pai, Ignazio, quando ali se dirigiu para tratar da compra de uma propriedade.

A primeira parte da trama corresponde ao enamoramento de Pietro Sala (um bon vivant, habituado a uma vida luxuosa, a gastos dispendiosos, ao convívio com a alta sociedade Europeia, a coleccionar arte e animais e plantas exóticos), e aqui surge a reflexão sobre a condição da mulher na sociedade ainda feudal da Sicília, Maria que sempre sonhara formar-se e ser professora aceita casar-se com Pietro, um homem mais velho que ela, que não ama, sentindo que, assim, libertará os pais do peso do seu sustento, sendo certo que estava disposta a trabalhar para sustentar os estudos dos irmãos e até de Giosuè (o seu melhor amigo, e que foi criado como se de mais um filho da família se tratasse). 

Giuseppina (Baronesa Tummia, por haver casado com Peppino Tummia, irmão de Titina), Sistina e Graziella ( irmãs de Pietro Sala) nunca aceitam Maria, que consideram inferior socialmente, e que lhes causa inveja devido ao facto de,  por ser uma pessoa bonita, inteligente, naturalmente sensível e bondosa, conquistar as boas graças do Sogro - Vito Sala - e aprender até a lidar com Anna, a sogra que se encontra mentalmente doente, serão firmes oponentes de Maria, a qual sempre irão hostilizar e criticar abertamente, não escondendo o quanto a odeiam.

As personagens mais fortemente modeladas e cuja evolução psicológica e amadurecimento vamos presenciando são precisamente Maria e Giosuè, que virão a descobrir que entre ambos existe uma relação que vai bem mais além da fraternidade, na medida em que viverão um amor sincero, forte, e que irá enfrentar duras provas como a distância física, as convenções sociais ( Maria é ainda uma mulher casada e mãe de família), o horror da II Guerra e o racismo e anti semitismo bem marcantes aos quais Giosuè não passará totalmente incólume,  muito embora comece por se afirmar enquanto Militar e consultor do regime Fascista, a verdade é que tudo mudará na sua vida com o surgimento do anti-semitismo muito por contaminação do regime Nazi, com o qual o Fascismo irá compactuar.

Já Pietro virá a revelar um lado negro, que apenas vai sendo revelado no decurso da trama, e que, curiosamente, dará a Maria a oportunidade de se afirmar como uma mulher forte, lutadora, responsável e merecedora do afecto e apreço do sogro Vito, assumindo o papel de defensora do património dos filhos Anna, Vito e Rita, entrando na gestão directa dos negócios da família, nomeadamente, das Minas de Enxofre.

Especialmente marcante e pungente, duma violência extrema, é o retrato que a autora nos apresenta da vida nas minas de Enxofre, deixando marca indelével na memória do leitor as condições de vida desumanas a que são sujeitos os aprendizes de mineiro, que vêem mesmo a vida encurtada devido a tal facto e que nos mostra uma realidade bastante cruel que resulta de uma visão ainda feudalista da sociedade Siciliana ainda herdeira de outras eras mais recuadas.

A escrita da autora é densa, rica em detalhes, requer concentração na sua leitura, não sendo esta uma obra que aconselhemos a ler de ânimo leve, mas não é, de todo, fastidiosa  esta leitura, é sim envolvente, arrebata-nos a alma, espicaça-nos o pensamento, enriquece-nos o conhecimento e faz-nos pensar na evolução da sociedade, no muito que mudou, e no outro tanto cuja semente permanece adormecida mas assustadoramente pronta a germinar de novo, sendo disto exemplo: o preconceito perante minorias, o racismo, novos tipos de colonialismo (revistos e actualizados e de que podemos considerar um bom exemplo o valor do petróleo), o risco de novos conflitos mundiais (com o perigo acrescido de meios bélicos ainda mais potentes e evoluídos).

O romantismo e a sensualidade também marcam presença, através da belíssima  e marcante e intensa história de amor entre Maria e Giosuè, cabendo destacar a troca epistolar entre ambos durante a II Guerra.

Também importa destacar a extrema riqueza de detalhe com que a autora faz a descrição das paisagens da Sicília, e do interior e vivência quotidiana dos vários núcleos familiares, ao longo dos vários períodos históricos que são percorridos na obra. A riqueza do registo descritivo despertará nos leitores uma nítida imagem mental que, certamente, evoca o nosso imaginário e tem o risco de suscitar o desejo de partir à descoberta dos cenários físicos onde se desenrola a narrativa, fica-nos ao menos o sonho de desvendar Palermo e cada recanto da Sicília ainda desconhecido, ou a revisitar, se for o caso.

Para concluir, é muito interessante analisar a evolução da metáfora pessoal e de narrativa familiar que contém a expressão que dá título ao livro, e que foi traduzida literalmente ( e em boa hora), "café amargo" pode ser caracterizado enquanto o percurso pessoal de amadurecimento e afirmação da alma muito feminina e da determinação, coragem e resiliência de Maria ao longo do seu percurso de vida.

Tudo é perfeito neste livro, de tal forma que intuo que, depois do muito que referi, irei lembrar-me de outros tantos aspectos  que o tornam fascinante e inesquecível, atrevo-me a sugerir uma nova leitura numa viagem a Palermo.


" - O amor à primeira vista, consome-te.(...)"


" Não estou apaixonado por ti, eu vivo de ti...Maria (...)"


Ficha Técnica do Livro:

Título: Café Amargo

Autora: Simonetta Agnello Hornby

Editora: Clube do Autor

Edição: Junho de 2017

Nº de Páginas: 368

Classificação: 5/5 Estrelas

Género: Romance Histórico

DIVULGAÇÃO LITERÁRIA | EM TODOS OS SENTIDOS (CRÓNICAS), de Lídia Jorge - DOM QUIXOTE

Nas livrarias a 16 de Junho


Na introdução que abre este livro, Lídia Jorge define a crónica como uma homenagem ao deus que faz escorregar os grãos de areia, mirando-nos de soslaio. E acrescenta: «Como não podemos vencer o Tempo, escrevemos textos que o desafiam a que chamamos crónicas.»

Em Todos os Sentidos, conjunto de quarenta e uma crónicas que Lídia Jorge leu, ao longo de um ano, aos microfones da Rádio Pública, Antena 2, corresponde a essa definição – são crónicas que encaram de frente a fúria do mundo contemporâneo, interpretando os seus desafios, perigos e simulacros com um olhar crítico acutilante.

Mas a singularidade destas páginas de intervenção provém, sobretudo, do facto de a autora ser capaz de juntar no mesmo palco da reflexão o pensamento crítico sobre a realidade e o discurso subjectivo da memória íntima, com um olhar profundamente sentido. No interior deste livro, há páginas inesquecíveis sobre a vida humana.

sábado, 13 de junho de 2020

CRÓNICA | NÃO CONSEGUIMOS RESPIRAR…, de Fernando Teixeira



Texto: Fernando Teixeira
Foto do Autor: D.R.


Na primeira crónica deste ano, desejei que 2020, mais do que um ano mais, fosse realmente um novo ano, diferente. Para melhor, desejava eu. Muito pelo contrário, este fatídico ano parece apostado em só nos apresentar dramas e motivos de apreensão, incerteza, confusão. Definitivamente, um ano para esquecer…
Digo “parece” e “só”, porque sei bem que uma moeda tem sempre duas faces. Se, por um lado, muitos acontecimentos negativos nos têm acompanhado desde Janeiro, também é verdade que toda essa negatividade revelou, em muitos de nós, o melhor do ser humano, quais heróis combatendo o mal com o bem, oferecendo entreajuda e amor ao próximo, incansavelmente.
Porém, são as imagens de dor e tragédia que demoram mais tempo a desvanecer-se da nossa mente, talvez porque as repudiamos e vão contra o nosso ideal de paz, saúde, tranquilidade e bem-estar.
O mundo ainda vivia submergido pela calamidade da Covid-19, a qual já provocou centenas de milhares de mortes, quando se viu confrontado com o angustiante vídeo do assassínio de um cidadão afro-americano, de nome George Floyd, deixado a asfixiar durante quase nove minutos, numa detenção policial de força bruta despropositada e inclemente, no estado norte-americano de Minneapolis. Através de imagens que correram o mundo inteiro, aquele homem de 46 anos, algemado e subjugado de bruços, suplicou diversas vezes que não conseguia respirar, e gritou pela mãe, enquanto um agente da polícia comprimia o seu pescoço contra o asfalto com o joelho e outros dois exerciam pressão nas costas do detido, alegadamente porque ele teria tentado pagar algo com uma nota de vinte dólares, supostamente falsa. É o que dizem. A ser verdade, uma vida por 20 dólares. Triste, muito triste, condenável. Sem palavras!
Tudo isto num mundo que recentemente tem visto partir muitos dos seus cidadãos, muitos deles também de bruços numa cama de hospital, também eles numa asfixia lenta e sem poderem implorar por clemência. Apesar de esmerados cuidados clínicos, dos seus peitos, invadidos por tubos de ventiladores mecânicos, saem brados silenciosos que, desesperadamente, repetem as mesmas palavras de George Floyd: I can’t breathe! Não consigo respirar!
O drama da pandemia que se tem vivido nos últimos meses, precisamente com os Estados Unidos no topo da tragédia, em número de casos e de vítimas, parece não ter produzido qualquer efeito, no sentido de sensibilizar mais, alguns, para o valor da vida humana que se pode perder quando menos se espera. Enquanto muitos a perdem prematuramente por contágio de um vírus maldito, ainda que o pessoal médico tente os impossíveis para reverter a sua situação crítica, George Floyd perdeu a vida às mãos de um elemento das forças de segurança de Minneapolis, e de seus cúmplices, que nada fizeram para o evitar, surdos aos apelos angustiantes da vítima e de testemunhas, devolvendo apenas aquele ar sobranceiro e gozão do poder da farda, ao mesmo tempo que uma vida se esvaía atrozmente.
Aquela morte evitável, no dia 25 de Maio, mergulhou dezenas de cidades dos Estados Unidos num caos de protesto e violência que sempre emerge quando se verificam estes atropelos à dignidade da vida humana, infelizmente frequentes na sociedade americana onde o estigma do racismo e das desigualdades de oportunidades, segundo a cor da pele, é sistémico e continua bem vivo.
O primeiro semestre de 2020 tem sido de tirar o fôlego. O flagelo pandémico que nos atingiu, ceifando centenas de milhares de vidas nos cinco continentes, e o pior da natureza humana, reflectido nas convulsões sociais a que temos assistido e sempre latentes um pouco por todo o lado, tiram-nos o fôlego. Não conseguimos respirar pelo George Floyd nem pelas inúmeras vítimas de violência e opressão, não conseguimos respirar pelas centenas de milhares de mortos da Covid-19, não conseguimos respirar por quem não consegue obter condições mínimas para sobreviver…
Se, nos tempos que correm, o uso devido de máscara nos incomoda, pois dificulta a livre respiração, regozijemo-nos por ainda o podermos fazer. Respiramos e vivemos. Lembremo-nos de quem já não tem esse privilégio. Que descansem em paz!

(O autor escreve segundo a ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.)

DIVULGAÇÃO LITERÁRIA | FURACÃO HAMILTON - NASCIDO PARA VENCER, de Sérgio Veiga - OFICINA DO LIVRO

Nas livrarias a 16 de Junho

Dos primeiros tempos nas pistas de karting em que chegou a ser vítima de bullying, por ser o único miúdo negro a competir, ao dominador incontestado da era híbrida da F1, com cinco títulos nas últimas seis épocas, Lewis Hamilton tem sido um batalhador incansável. Filho de um ferroviário britânico ultrapassou a hostilidade dos primeiros anos falando apenas em pista e impondo o seu talento inato para ir abrindo as portas até ao sonho da F1. E, lá chegado, tomou de assalto a mais difícil disciplina do desporto automóvel, sendo campeão do Mundo logo no segundo ano!
A história da ascensão de Hamilton na F1 é recheada de episódios surpreendentes, muitos deles desconhecidos, apesar de ser um dos desportistas mais mediáticos do Mundo. A sua evolução desde que começou a correr, aos 8 anos, quer como piloto quer como pessoa, é uma autêntica lição de permanente reinvenção, alimentada por uma grande humildade e forte espírito de autocrítica. Assim se construiu um hexacampeão de F1 que mostra viver um período de grande paz interior... o que o torna ainda mais perigoso para os seus jovens adversários!

sexta-feira, 12 de junho de 2020

CRÍTICA LITERÁRIA | "Sonho de Cetim", de Loretta Chase | Chá das Cinco - Grupo Saída de Emergência


Texto: Isabel de Almeida | Crítica Literária | Jornalista | Editora

Foto: D.R.


Sonho de Cetim, de Loretta Chase, corresponde ao segundo romance da denominada trilogia das modistas, que acompanha as peripécias das três irmãs Noirot, na Londres de 1835, no momento em que as famosas e sofisticadas Modistas da Maison Noirot tentam, a todo o custo, derrotar a concorrência da desonesta Hortense Downes, enquanto a alta sociedade ainda se refaz da ascensão da Duquesa de Clevedon.

Neste romance assume especial protagonismo Sophia, a mais astuciosa das irmãs Noirot, responsável por fazer chegar à imprensa da época, por meio de estratagemas e disfarces, a descrição completa das toilettes preparadas no atelier da família, extremamente inteligente, disposta a sacrificar a vida amorosa em prol do negócio de família.

Quando a melhor cliente da Maison Noirot - Lady Clara Fairfax - ex-noiva do Duque de Clevedon e irmã de Lorde Longmore foge de Londres para escapar à humilhação pública, ao sentir-se presa a um casamento votado ao fracasso, é Sophia que assume as rédeas da situação e parte com Lorde Longmore em busca da jovem dama em fuga.

Lorde Longmore é um nobre libertino, tem fama de ser pouco inteligente, mas é antes alguém que procura abstrair-se de algumas regras sociais, e das pressões familiares impostas pela sua rígida e intrusiva mãe - Lady Warford, uma mulher que vive de aparências e do politicamente correcto, sofrendo perante a indisciplina dos filhos.

No meio de inúmeras aventuras verdadeiramente hilariantes, assistimos ao desenrolar da narrativa, e constatamos que começa a surgir entre Sophia e Longmore uma forte atracção que ambos procuram negar a si mesmos.  Esta possibilidade de romance assusta os protagonistas por razões diferentes, Sophia receia enfrentar a inimizade da mãe de Longmore, a autoritária e influente Lady Warford e o julgamento de toda a alta sociedade, ao passo que Longmore receia não saber descortinar o que é verdadeiro e o que é falso na astuciosa e bela Sophia, uma verdadeira rainha do disfarce.

Com um ritmo bastante rápido, um bom leque de personagens secundárias, muitas voltas e reviravoltas, e um perfeito exercício de sátira social, com personagens com as quais é impossível não se simpatizar, e que nos conquistam pelas suas muitas e deliciosas imperfeições, estamos perante uma leitura que irá cativar os adeptos deste género literário [romance histórico sensual], e que nos deixa com um permanente sorriso nos lábios, perante a comicidade de diversas peripécias da trama.

Ficha Técnica do Livro:



Série: As Modistas #2

Autora: Loretta Chase

1ª Edição: Janeiro de 2016

Editora: Chá das Cinco [Grupo Saída de Emergência]

Nº de Páginas: 304

P.V.P.: 17,76€

Género: Romance histórico sensual

Classificação: 4/5 estrelas